quinta-feira, 25 de junho de 2009

Trecho de Bel e Bernardo - História de Tânia

Na época em que eu escrevi, não conseguia imaginar um rosto para o Bernardo. Então assisti Austrália e achei o meu Bernardo!

Trecho do segundo capítulo de Bel e Bernardo:

- Bel? – Grazi me cutucou de leve pelas costas – O Sr. Bernard pediu para eu te chamar. Ele quer te ver na sala dele.
Engoli em seco e demorei mais que o habitual para me levantar.
- Onde é a sala dele, Grazi?
Ela me indicou o lado direito, no fim do corredor.
- Boa sorte. – Grazi balbuciou e novamente eu pude ver o nervosismo estampado em sua face.

Eu bati na porta fechada e ouvi um “entre” me autorizando a prosseguir. Voz bonita – conclui - antes de girar a maçaneta com receio.
Ele estava de costas para mim, olhando a janela que havia nos fundos da sala. Era alto, tendo em torno de 1,87 metros de altura. Cabelos castanhos e lisos, bem vestido e perfumado. Aspirei seu perfume, tão logo entrei, extasiada com aquele cheiro. O corpo parecia bonito, braços fortes e musculosos, mas não dava para ver muito, pois ele se mantinha de costas e havia pouca luz na sala. Além da claridade vinda da janela havia apenas uma pequena luminária de mesa acesa.
E ele nem se deu o trabalho de se virar para me olhar, mesmo sabendo que eu estava ali. Mesmo ele tendo me chamado para estar ali. E começou a falar comigo ainda virado de costas.
Que falta de educação! Eu pensei, com raiva. Mas me controlei, lembrando da face nervosa de Grazi. Eu não deveria prejudicá-la e eu já gostava dela.
- Você é mesmo prima da Grazi? – ele indagou, ainda de costas.
- Sim - eu balbuciei, com minha voz trêmula.
- Você não se parece nada com ela – era uma afirmação, não uma pergunta. – Eu apenas gostaria de saber, por que você está fazendo isso. Você não espera que eu te pague pelo teu trabalho, não é mesmo?
- Não. Claro que não... Eu não preciso que você me pague, só estou ajudando a Grazi e a Paula. – minha voz soou pouco firme.
- Paula? Vai me dizer que você conhece a Paula? É prima dela também?
Ele enfim se virou e me encarou. E era simplesmente lindo! Não havia um modo certo de descrever sua face, as linhas de seu rosto formavam um perfeito desenho e era difícil de tirar os olhos dele. E eu fiquei congelada, sem conseguir desviar meu olhar do seu rosto, e completamente boquiaberta. Mas a expressão que ele fazia, o modo com que ele me olhava naquele momento, era de pura raiva.
Agora tudo fazia sentido! Por isso Grazi temia tanto aquele homem. Seus olhos castanhos e lindos carregavam uma raiva intensa, que me chocou por um momento. Fiquei paralisada, mas não consegui desviar os olhos do rosto dele. Devo ter parecido uma completa idiota e ele deve ter percebido, pois por fim suavizou sua expressão e pareceu rir por um momento. Mas deve ter sido só impressão minha, pois logo seu rosto tornou-se novamente carregado.
- Eu não sou prima da Paula, na verdade nem a conheço. Mas sou mãe também. – eu enfim rompi o silêncio, me controlando para ele não perceber a gagueira que eu procurava disfarçar. Para ele não perceber o quanto eu ficava nervosa com a sua presença.
- Mãe? E o que isso tem a ver?
- Eu entendo bem o motivo da sua falta e quis ajudar. Além disso, não tinha mesmo nada para fazer e estava entediada...
- Tédio? Então tudo isso foi por puro tédio? Imagina se todos os hóspedes resolvessem trabalhar quando estivessem entediados!
- Não, não foi por tédio. Você não entende, não foi isso o que eu quis dizer.
- Então o que você quis dizer? – ele me perguntou, com um olhar irracional, com a cólera refletida em seus olhos.
- Você tem filho, Sr. Bernard?
Percebi que ele demorou um pouco para responder, pareceu ficar alterado com a minha pergunta, pareceu fraquejar por um momento, mas logo se recompôs.
- Não, não tenho filhos. – ele enfim respondeu e pela primeira vez manteve os olhos baixos, evitando me encarar.
- Então você não pode entender por que eu estou ajudando a Paula. Por que eu também sou mãe! Por que quando um filho adoece, não há nada mais importante para uma mãe do que a saúde da criança. Por isso eu estou ajudando. E estou ajudando com o maior prazer! E não quero nada em troca por isso. Chame isso do que quiser: de solidariedade, de compaixão. Mas eu estou fazendo por prazer e não quero receber nenhum dinheiro por isso. Entendeu? – eu já estava irritada e elevei o meu tom de voz mais do que o usual.
Eu andava um pouco de um lado ou outro da sala ao prosseguir com a minha explicação. Quando parei de falar e o encarei, ele estava me olhando fixamente, seu queixo apoiado em seu pulso. E naquele momento, não parecia mais irritado como antes. Naquele momento, ele me pareceu ser um homem triste. Triste até demais. Mas talvez fosse só impressão minha e eu não sabia nada sobre a vida dele.
- Eu entendo. Eu entendo mais até do que você possa imaginar. Bom, se isso te faz feliz e se é isso que você quer fazer, eu não vou interferir. Pode ajudar a Grazi, ela sendo tua prima ou não. Só não espere receber nada de mim por isso. Agora pode ir.
Ele praticamente me expulsou da sala com sua última frase. Mas eu me mantive fixa, sem me mover. Fiquei mais um tempo encarando aquele homem. Eu o temia, mas não conseguia tirar os olhos dele. E eu olhava para ele, mesmo sem querer olhar. E de alguma forma era como se eu tivesse colada no chão, pois não conseguia me mover. E ele parecia estar colado também, pois também não se mexeu. E eu, ainda parada à sua frente, era como se de certa forma o enfrentasse. E ele parecia pouco acostumado com isso e talvez um pouco surpreso também.
- Quer mais alguma coisa? – ele enfim indagou, após um momento de silêncio. Mantinha os braços cruzados sobre o peito e os olhos fixos em mim. Como se tentasse ler meus pensamentos. Mas isso seria uma tarefa impossível, pois nem eu sabia o que pensar naquele momento.
- Não. Está tudo bem. Posso continuar ajudando a Grazi mesmo? – tentei simular meu tom casual de voz.
Ele assentiu com a cabeça, com a mesma expressão séria de sempre. Mas eu sorri, como se tivesse vencido uma luta. Eu sorri e olhei para ele, mais corajosa e segura de mim. Primeiro um sorriso tímido, mas depois relaxei e mostrei alguns dentes. Ele não era tão ruim como parecia, eu agora tinha certeza. Apenas parecia um homem que queria afastar as pessoas e mantinha esse comportamento para isso. Mas eu sorri e mantive o meu sorriso por um tempo nos lábios, enquanto olhava para ele. E ele por fim sorriu de volta. Não era bem um sorriso, era mais uma leve contração dos cantos da boca. Mas eu me senti vitoriosa assim mesmo. Então me despedi e saí da sala, mais curiosa ainda para saber sobre esse homem do que quando eu entrei.
Sai dali meio atordoada, e não queria que ninguém percebesse como eu me sentia. Acenei ao longe para Grazi, que não pareceu surpresa ao me ver querer ir embora de imediato. Corri direto para a minha distante cabana, que naquele instante pareceu mais distante ainda. Precisava pensar, precisava colocar a cabeça no lugar. Aquele estranho me desnorteava. Fechei a porta e me joguei na cama. Mas demorei para dormir. Não conseguia tirar aquele rosto da minha cabeça. Não conseguia esquecer aqueles traços perfeitos. E por mais que eu tentasse me desligar, parecia que aqueles olhos furiosos ainda me vigiavam.

Um comentário:

  1. essa história parece ser interessante, aliás como todas que eu já que vc posta ou aqui ou no orkut, não ter mais?

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