quinta-feira, 25 de junho de 2009

Trecho de Doze Verões - história de Tânia


Trecho do quarto capítulo de Doze Verões

- Pedro? – eu chamei, ainda parada a porta, pois ele estava lendo uma revista e não prestara atenção em mim. Agora que a gente cresceu, cada um tinha o seu próprio quarto.

- Sim? – ele então levantou a cabeça e me encarou. Pareceu espantado. Ficou boquiaberto por alguns momentos e depois mudou totalmente sua expressão – Onde você pensa que vai vestida dessa maneira? – indagou de maneira ríspida.
- Como assim, Pedro? – arqueei minhas sobrancelhas, sem entender nada. Eu queria saber se eu estava bonita e ele parecia tão enfurecido que me confundia.
- Com essa roupa minúscula! Você não vai sair assim! – ele parou de pé, na minha frente, me confrontando. Ele tinha alguns centímetros a mais do que eu. No último ano eu havia crescido bastante, quase a ponto de alcançá-lo. Mas eu sabia que ele continuava crescendo, enquanto que eu já tinha praticamente parado.
- Claro que eu vou sair assim. – eu o enfrentei, com um pouco de raiva.
- Não vai não. Eu vou falar com a tua mãe...
- Pedro – eu o interrompi, alterada – Foi a minha mãe que escolheu a minha roupa e não há nada de errado com ela.
- Ah... – ele ficou sem argumentos e começou a caminhar nervoso pelo quarto.
- Então, Nanda... Eu vou ficar o tempo todo do teu lado. Hoje de noite.
- Como assim, Pedro? – eu devo ter elevado meu tom de voz, com o susto. Um guarda-costas naquela noite era tudo o que eu menos queria. – Não. Não vai não.
- Porque não? Eu não sou mais o teu melhor amigo?
- É sim, melhor amigo, mas não o meu guarda-costas. – fiz uma expressão séria e o encarei.
- Guarda-costas? – ele indagou, surpreso.
- Você pode fazer o que quiser Pedro, mas hoje eu vou beijar na boca. Eu já fiz trezes anos, eu cumpri a minha promessa.
- Ah! Então é isso que você pretende? Eu vou contar para os nossos pais então.
- Não! Se você fizer isso eu nunca mais olho na tua cara – eu coloquei o dedo na frente do rosto dele. Já estava completamente fora de mim.
- E posso saber quem você pretende beijar?
- Eu não digo. – eu cruzei meus braços sobre o meu peito e evitei encará-lo. Sentei no sofá e fiquei quieta, me controlando. Eu estava a ponto de chorar. Um pouco por raiva, um pouco por frustração.
Ele sentou em meu lado e reparou em minha expressão.
- Desculpa, Nandinha... Eu me descontrolei... Desculpa.
Eu olhei para ele, mas ele observava o chão. Parecia nervoso e realmente arrependido. E como eu não falei nada, ele continuou, como se falasse para ele mesmo:
- Acho que você está certa. Eu vou ter que me acostumar com isso. Afinal, você não é mais uma criança. – sua voz pareceu levemente melancólica. – Mas você é minha irmãzinha, Nanda. E é a minha obrigação te proteger. Você entende?
- Acho que sim...
Então nossos olhares se cruzaram pela primeira vez depois da briga besta e eu me senti encorajada para perguntar o que eu gostaria:
– Mas Pedro... Eu só vim aqui no teu quarto porque queria saber se eu estou bonita. – mordi meu lábio e fiquei esperando com ansiedade pela resposta.
- Se você está bonita? – ele pareceu incrédulo – E você não sabe?
- Não.
- De todas as meninas daqui da praia você é a mais bonita, Nanda.
- Verdade? – meus olhos brilharam e eu abri um largo sorriso. Mesmo se fosse mentira, eu gostei de escutar.

- Sim, Nanda. E hoje você está muito mais do que bonita. Linda talvez seja a palavra mais adequada.
- Sério? – eu me empolguei – Então quer dizer que eu vou conseguir beijar na boca?
- Acredito que não faltarão candidatos. – ele suspirou e pareceu inconformado. Talvez até levemente enciumado.
- Mas o problema, Pedro, é que eu não quero beijar qualquer um. E o único menino por quem eu me interesso talvez não esteja disponível no momento.
- E posso saber quem é? – ele tentou aparentar calma e eu percebi o quanto ele se esforçava para isso.
- Não. Agora não. Talvez depois, Pedro. – eu sabia que ele não iria aprovar se soubesse que eu gostaria de ficar o Bruno, por causa de sua namorada.
- Você está pronta? Vamos indo para a praia?
- Você quer ir comigo? Eu fiquei de passar antes na casa da Raquel e encontrar a Natália e a Milene lá.
- E eu posso ir junto?
- Claro. Acho que elas não irão se importar. Aliás, nem um pouco. – eu ironizei e forcei um sorriso.
- Hum... – ele se fez de desentendido.
- Sim, das minhas amigas só falta a Raquel para você ficar. Por que você não aproveita e faz isso hoje, hein? Pedro galinha – eu provoquei e mostrei a língua para ele.
- Rá-rá. Engraçadinha. – ele resmungou.
- O que foi, irmãozinho? Qual o problema? Você é mesmo um galinha. Por isso que eu digo: deve ser booooom beijar na boca.
- Hunf – ele fechou a cara. – Para de falar besteira, maninha. – ele falou a palavra maninha de forma especialmente irônica - Vamos indo que já está tarde.
- Ok. Maninho. – eu repeti seu tom sarcástico.
O clima estava agradável e havia uma lua cheia iluminando o céu. Perfeito para um beijo na boca. Minhas amigas caminhavam na nossa frente e eu ia atrás de braço dado com o Pedro. A gente conversava e ria, como os melhores amigos de sempre. O pequeno atrito que tivemos no quarto alguns minutos antes foi completamente superado.
Havia uma fogueira montada na beira para praia: bonita, alta, que me deixava fascinada olhando. Eu tinha uma atração pelo fogo. Desde pequena adorava brincar com velas. Colocar meu dedo na chama da vela, brincar com a cera derretida e fazer o formato do meu dedo com a cera mole e quente. E por vezes até me queimar. E eu olhava tão fixamente para o fogo, que nem percebi a aproximação do Bruno.
Ele parou do meu lado e me ofereceu uma bedida: um refrigerante, mas por baixo do copo havia um bilhete, que eu peguei discretamente. E com meu coração batendo agitado, me afastei da movimentação para ler. E nem percebi que eu estava sendo seguida.
O bilhete dizia: “Meu encontre às 23 horas na casa de salva-vidas número 2.” Eu olhei para o meu relógio: eram 22:15.
O luau estava sendo realizado próximo à casa de numero 3, a número dois ficava um pouco mais a frente. Suficiente longe do movimento. Suficientemente longe para que a namorada dele não visse nada. Mas não tão longe a ponto da gente demorar e alguém perceber a nossa ausência.
Então é isso, às 23 horas eu darei meu primeiro beijo. Eu suspirei, absorvendo uma grande quantidade de ar pelo nariz e depois soltando rapidamente. Rapidamente pelo susto, pois ao inspirar eu reconheci o perfume do Pedro e logo percebi que ele estava parado do meu lado.
- Deixa eu ver esse bilhete. – ele arrancou o papel da minha mão tão rápido, que eu fiquei sem reação.
Eu o observei, temerosa. Com medo de como ele reagiria. Eu sabia que eu estava fazendo algo errado e não queria que ninguém soubesse. E até aquele momento, ninguém sabia.
- Não, Nanda. O Bruno não. Ele tem namorada, isso não é legal – Surpreendentemente ele não estava irritado e sim preocupado. – Você gosta dele, Nanda?
- Não, Pedro. Eu não gosto dele. Só queria mesmo dar um beijo na boca.
- E por que ele? Tem tantos outros caras legais para você se interessar.
- Mas ele é o segundo mais bonito aqui da praia. Os outros são feios. – eu resmunguei e falei sem pensar.
- Segundo? E quem é o primeiro?
- Ops. Falei demais – eu ri meio nervosa – Quem você acha que é? É você mesmo, seu bobo.
- Sério? – ele pareceu satisfeito.
- E você não sabe disso? Com tantas meninas correndo atrás...
- Eu sei que elas me acham bonito, mas não que você me achava também.
- Ok, mas agora você sabe. E eu não queria ter dito isso, agora você ficará ainda mais convencido.
- Hum... – ele pareceu pensar e ficou em silêncio e eu fiquei calada, curiosa, observando sua expressão.
- E você só quer um beijo na boca? Se você tiver um beijo na boca você promete que não fica com o Bruno? Eu não quero que você se magoe.
- O quê? – eu indaguei, confusa. Não sabia o bem o que ele queria dizer, mas eu respondi igual. – Eu só quero um beijo na boca, não precisa ser do Bruno. Eu já te disse isso.

- E se eu te conseguir um beijo, você promete que não fica com o Bruno?
- Se for bom, eu prometo. – eu não sabia aonde ele pretendia chegar com aquelas perguntas. Jurei que ele quisesse me apresentar para algum amigo que eu não conhecia. Talvez ele tivesse um amigo bonito que eu nunca vira. Mesmo sendo algo difícil para aquela prainha pequena, não era impossível.
Então ele me puxou pelo braço e me levou para trás das dunas. Eu não sabia o que ele planejava, mas eu fui igual. Eu confiava nele. Ele era o Pedro, meu companheiro, meu melhor amigo.
Ele parou de caminhar e ficou na minha frente, parecendo meio indeciso. Eu franzi minha testa, confusa, e fiquei olhando para ele. Eu pensava: o que será que ele quer? Estávamos sozinhos e não havia ninguém por perto.
Ele respirou fundo e então eu percebi o que ele planejava. Mas não deu tempo de reagir. Fui pega completamente de surpresa e quando eu vi, os lábios dele já estavam colados nos meus. No início, eu nem me mexi. Mas os lábios dele se moviam gentilmente sobre os meus e sua boca era tão quente e macia que eu fechei meus olhos e resolvi aproveitar. Afinal, era o meu primeiro beijo.
E eu me entreguei completamente. Instintivamente e aos poucos, eu fui correspondendo. Automaticamente, meus lábios foram entreabrindo, timidamente no começo, e a língua dele de forma delicada invadiu minha boca, a procura da minha. Nossa! Foi muito bom quando a minha língua encontrou com a dele. E eu coloquei meus braços em volta da cintura dele, apertando meu corpo no dele, quando ele me abraçou também.
Meus lábios se moviam mais velozes agora e eu estava completamente sem fôlego, ofegante. A língua dele parecia querer brincar com a minha, girando, rodando pela minha boca. E sensações maravilhosas, que eu sequer imaginava que existissem, percorriam todo o meu corpo. E isso que era só o meu primeiro beijo! E eu queria que nunca mais acabasse. Mas então ele parou e se afastou.
- Só fiz isso para que você não ficasse com o Bruno – ele se justificou. Mas não parecia arrependido.
- Ah... - eu ainda estava confusa, atordoada.
- Agora podemos voltar. Vamos?
- Não! – eu quase gritei e finquei meu pé no chão. – Isso não é justo Pedro, eu quero mais.
- Mas não é certo, Nanda. A gente não devia...
- Devia ter pensado nisso antes de me beijar. Agora é tarde. – eu cruzei meus braços, contrariada. – Eu não vou voltar. E se você não me beijar agora de novo eu ainda vou me encontrar com o Bruno. Esse teu beijo só me deixou querendo mais. Você que sabe.
Eu olhei para cima e fiquei contando as estrelas, para me distrair.
- E o que você quer fazer, Nanda? – ele voltou para perto de mim e indagou num tom sedutor. Num tom de voz que eu nunca tinha escutado da boca dele.
- Quero mais beijo. E quero ficar com você hoje.
- Só hoje, não é?
- Claro que é só hoje. A gente não pode fazer isso, mas já que o estrago já foi feito mesmo, eu quero mais é aproveitar.
Ele me olhou e riu.
- Você gostou do meu beijo então? – ele indagou, realmente interessado.
- Olha, eu não tenho muita referência de beijo, mas se todos forem assim está ótimo.
- Acredite, Nanda, nem todos são assim.
- Quer dizer que você beija melhor do que os outros?
- Não, sua besta. O que eu quero dizer é que existe uma coisa chamada de química, sabia?
- O que quer dizer?
- Que gente junto funciona, entende?
- Ah... Entendi. Mas Pedro?
- O quê?
- Cala a boca e me beija logo.
- Tá. – ele riu e eu não vi mais nada. Só prestei atenção no rosto dele se aproximando e depois no lábio dele se movendo em sincronia com o meu. No chão sumindo sob os meus pés. E nas sensações maravilhosas que eu sentia. Quem diria que meu primeiro beijo seria com o Pedro.
- Que horas você tem que ir para casa hoje, Nanda? – O Pedro perguntou após a gente estar há quase uma hora se beijando sem parar.
- Hoje a mãe deixou em chegar à 1:30. – eu demorei para responder um pouco, retomando o meu fôlego. A gente estava sentado no meio das dunas, completamente escondido, pois ninguém podia nos ver. E eu me joguei para trás, deitando de costas.
- Você vai ficar com os cabelos cheios de areia. – ele observou, ainda sentando.
- Eu não me importo. – eu respondi sem me mexer. Fiquei olhando para a lua cheia, sorrindo, alegre. – Hoje está uma noite tão linda, né?
- Sim, Nanda. – mas eu percebi que ele não olhava para o céu, ele olhava para mim. E ele deitou do meu lado e continuou me olhando.
- O que foi, Pedro?
- Nada. – ele respondeu e finalmente desviou o olhar.
- Ah, não. Me fala que eu quero saber – eu resmunguei. – Você ainda é o meu melhor amigo e melhores amigos não têm segredo. E você sempre me conta sobre as meninas que fica, então pode me contar sobre mim também. Eu acho – eu ri, um pouco confusa. Mas não foi um sorriso forçado, saiu naturalmente porque eu estava feliz.
- Ah... É que eu tava pensando...
- O quê? – eu arregalei os olhos, esperando.
- Sabia que de todas as meninas que eu fiquei você foi a que eu mais gostei?
- Sério? Mas sério mesmo? – eu me empolguei. O Pedro já tinha ficado com várias meninas, então eu podia considerar isso como um baita elogio. Talvez eu beijasse bem.
- Seríssimo.
- Ah! Que legal! Eu também digo o mesmo, mas como você foi o único meu elogio então não vale tanto. – eu respondi olhando nos olhos dele. E depois olhando para a boca dele, que estava novamente próxima à minha. Ah... A boca dele! Era simplesmente irresistível estando tão perto.
- Agora eu não sei, Nanda. A gente não pode mais ficar... Você sabe disso, não sabe?
- Sei.
- E será que não vai ficar confuso?
- Acho que não. – eu nem pensava nessa possibilidade. Beijar era tão bom e eu sabia que não podia mais beijar o Pedro. Mas essa minha descoberta abria um novo universo para mim: várias bocas para beijar, vários meninos diferentes para eu provar. E era nisso que eu pensava naquele momento.
- Hum... – ele pareceu preocupado, bem ao contrário de mim. Eu só pensava em aproveitar aquilo e preocupação era algo completamente inexistente nos meus pensamentos.
- Pedro, que horas são agora?
Ele olhou em seu relógio de pulso.
- 23:50.
- Será que o Bruno ficou me esperando por muito tempo? – eu lembrei e dei risada, não demonstrando nenhum traço de arrependimento. E a minha expressão fez o Pedro rir também.
- Coitado, Nanda. – ele parou de rir e me surpreendeu.
- Por que coitado? Se foi você mesmo que me impediu de ir? – eu indaguei confusa.
- Por que ele perdeu uma oportunidade única. – ele me olhou e deu um sorriso irresistível e sedutor.
- Ah... – eu fiquei sem graça. – Me beijar é uma oportunidade única?
- É sim. Pena que eu não vou poder repetir. Aliás... – ele arregalou os olhos e me encarou de um modo que eu gelei. Até esqueci de respirar.
- Aliás o quê, Pedro? – mesmo com vergonha pelo jeito que ele me olhava eu não desviei meu rosto e mantive meus olhos fixos nos dele. Ele era o Pedro, o meu melhor amigo e quase irmão, e ter vergonha dele era totalmente ridículo.
- Aliás, acho que a gente está perdendo tempo agora.
- Hum?
- Cala a boca e me beija, Nanda. – ele repetiu as mesmas palavras que eu já havia dito e sorriu. O sorriso mais lindo que eu já vi na minha vida.

Um comentário:

  1. Relendo esse trecho eu lembrei: eu amoooooooo o Pedro. Ele na verdade sempre foi o meu personagem preferido, eu tinha esquecido disso.

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