sexta-feira, 26 de março de 2010

Tempo de Ser Feliz - capítulos 10 a 15


Capitulo 10

- Isa! – ela entrou no Pub agitada e praticamente gritou para chamar a amiga.
- Melanie! O que você faz aqui tão cedo? E sem o Bill?
- Eu vim antes para falar contigo, para te alertar sobre uma coisa.
- O que foi, Mel? Assim você está me assustando.
- É que hoje é o aniversário de Valentine e ela fez questão de comemorar aqui no Pub.
- Sim, e daí?
- Como assim e daí? Você não sabe que ela e o Adam, o teu Adam, estão namorando? Isa! Você está preparada para ver os dois juntos, amiga?
Isa franziu as sobrancelhas e ficou nervosa.
- Não, Mel. Não estou preparada. O que eu faço? – indagou com aflição.
- Você não deve deixá-los perceber como se sente, Isa. Você deve aparentar tranqüilidade e calma. Se demonstrar qualquer sentimento, Valentine se sentirá vitoriosa e fará tudo para te ferir. Ela não gosta de você, Isa. Nem ela, nem Rebeca.
- Rebeca também virá?
- Penso que sim, pois elas são grandes amigas. E ela não perderia a oportunidade de rever Gerard. Rebeca ainda gosta dele, Isa. E eles já terminaram e voltaram tantas vezes, que ela deve estar confiante que desta vez não será diferente.
- É, eles podem voltar. Gerard anda meio triste, meio cabisbaixo.
- Eu já notei, mas creio que não é por causa dela. Isa, por que você não dá uma chance a ele?
- Como assim, Melanie? – encarou a amiga incrédula - Você mesma disse para eu não me envolver com ele.
- Sim, mas agora é diferente, ele está solteiro. E depois, você poderia ficar mais animada, não gosto de te ver sofrendo. E além do mais, você não tem planos de ficar aqui mesmo, se algo desse errado você poderia voltar ao Brasil. E ele é tão lindo, Isa. Olha só para ele! Pelo menos poderia se divertir com ele. E depois, um pouco de sexo não faz mal a ninguém. – sorriu, maliciosa.
Ambas observaram Gerard, que estava de costas, analisando-o dos pés a cabeça e sorriram.
- Sim, ele é lindo mesmo. Mas Adam é mais lindo ainda. – suspirou.
Melanie a encarou apreensiva.
- Você está mesmo apaixonada por ele, não é mesmo?
Ela assentiu.
- Melanie! Que surpresa você aqui tão cedo! – Gerard cumprimentou a amiga com simpatia. – E então o que quer beber?
- Ah, pode ser a cerveja de vocês, que eu adoro.
Serviu-a de um copo e perguntou:
- Agora se importa se eu roubar um pouquinho a Isa? Preciso falar a sós com ela.
- Não, de maneira nenhum. Eu ficarei bem aqui. – piscou para a amiga assim que ele se virou de costas.
*
- O que foi, Gerard?
Ele não sabia como introduzir o assunto.
- Isa, é que hoje o meu primo virá com Valentine. – afirmou, preocupado com ela.
Ela achou engraçado: antes era Adam que se preocupava com ela, agora o jogo havia invertido.
- Eu já soube. Melanie veio mais cedo para me contar. Aliás, estou muito satisfeita com a preocupação de vocês. Fico tão feliz por ter amigos tão queridos!
- E você gostaria de ser dispensada hoje?
- Não! De maneira nenhuma! Isso só daria margens para fofocas.
- Que bom, pois eu precisarei de você. Primeiro porque o movimento estará grande, e depois porque preciso de você ao meu lado para me ajudar a me livrar de Rebeca.
- Mas o que eu posso fazer?
- É só ficar perto de mim – ele sorriu – A Rebeca te odeia.
- Ah... Por que isso? Eu não fiz nada e duas mulheres me odeiam: Valentine e Rebeca.
- Sexto sentido feminino. E você fez sim, você conquistou os homens delas.
- Hum... – ficou com vergonha, ruborizou e se calou.
“Se eu tivesse conquistado Adam de verdade ele estaria comigo e não com Valentine” – refletiu, com tristeza.
- Qualquer coisa, se não se sentir bem, ou quiser ir embora, é só me pedir, está bem?
- Sim. – Olhou para ele e sorriu. – Obrigada, Gerard.
Chegou perto e beijou-o no rosto, num gesto de agradecimento. Ele aproveitou para abraçá-la com apenas um braço, mantendo-a perto de si. Isa então prolongou o contato de seus lábios com a bochecha dele. Após finalizar o beijo, permaneceram abraçados, e ela apoiou a cabeça em seu ombro. Ele aproveitou a proximidade e deu um beijo em sua bochecha, e depois deu outro e mais outro. E como ela não reagiu, apenas sorriu, ele chegou próximo à boca e beijou-a no cantinho dos lábios. Ela continuou sorrindo, afinal Gerard era lindo, querido e ela estava carente. Ele então deu um selinho em seus lábios, prolongando o contato de seus lábios contra os dela fechados.
- Isa? – ele murmurou, mantendo seus lábios sobre os dela fechados.
- Hum?
- Eu quero muito te beijar.
- Então beija. – ela então autorizou sorrindo. Não tinha porque fugir. Era livre e desimpedida e Adam estava com Valentine.
Ele não teve duvidas e a beijou. Mas desta vez foi diferente da outra vez. Foi um beijo mais delicado, mais tranqüilo. Ele explorava a boca dela numa calma mais controlada e não parecia mais querer engoli-la como no primeiro beijo. Isa não sentia por ele o que sentira por Adam, o beijo dele não trouxe os mesmo sentimentos que o de Adam, mas mesmo assim, foi um beijo bom. Foi um beijo gostoso, suave, mas sem paixão.
Pararam de se beijar e passaram a se encarar.
- Obrigado, Isa. Você me dará uma chance então? Uma chance de tentar fazê-la feliz?
- Não sei, talvez.
- Bom, talvez já é alguma coisa. – ele sorriu, acariciou-a no rosto e colou novamente seus lábios nos dela.
- Mas eu não posso te prometer nada, não posso mentir para você. – ela interrompeu o beijo e como ele não esboçou nenhuma reação e não disse nada, voltou a beijá-lo.
- Agora temos que voltar. Daqui a pouco os clientes começarão a chegar.
- Gerard, eu tenho que te pedir uma coisa. Não quero que pense que eu estou me aproveitando da situação, pois eu te pediria isso de qualquer maneira. E você pode negar meu pedido, se quiser. Embora eu gostaria muito, mas muito mesmo, que não o fizesse.
- O quê, Isa? O que você quer?
- Eu preciso de uma folga para amanhã. Preciso muito de uma folga! Sei que é de última hora, mas depois posso compensar e trabalhar dobrado para recuperar meu horário. É que meu cunhado, quer dizer, o irmão de Erik, chega amanhã e eu gostaria muito de passar o dia com ele.
- Quantos anos ele tem?
- Por que, está com ciúmes? - Ela riu. – Ele é como se fosse meu irmão, Gerard! Tem 25 anos e é o irmão mais novo que eu nunca tive. Por favor – ela implorou – Preciso muito dessa folga, por favor, Gerard.
- Está bem. Eu sentirei tua falta, ainda mais que amanhã é sábado, dia de muito movimento. Mas eu posso pedir para um funcionário da tarde trocar ou dobrar o turno. Não se preocupe, darei um jeito, se isso é tão importante para você. Mas Isa, não deixe nenhum outro funcionário saber, não posso dar essas regalias para todos.
- Está bem. Eu sou uma funcionaria VIP – debochou – Tenho tratamento especial.
- Com certeza, por acaso você acha que eu saio beijando todas as funcionárias assim?
- Olha... Todas não, mas a maioria, pelo que eu fiquei sabendo. – zombou.
- Ah.... – ficou sem graça. – Mas nenhuma foi tão especial para mim quanto você é.
- Ahãm, sei. – gracejou.
*
- Mel, segui teus conselhos. – voltou sorrindo.
- Qual deles, Isa?
- De aproveitar e me divertir com Gerard.
- Sério? Por isso que vocês demoraram? – sorriu – agora conte tudo, amiga.
- Bom, ele não é nenhum Adam Simons, mas dá para o gasto. – debochou.
Melanie gargalhou.
- Que bom, amiga. Que bom te ver alegre dessa maneira. Agora vou sentar à mesa reservada para a gente, já chegaram algumas pessoas e eu só estava a tua espera para me sentar lá. Inclusive Isa, não olhe agora, mas Rebeca acabou de entrar e está indo direto falar com Gerard. Não vire para olhar, Isa. Deixa que eu te conto, porque ela está só nos observando. – Melanie cumprimentou Rebeca, da forma mais simpática que pôde.
- Agora ela está se dirigindo à mesa – continuou narrando, falando baixo – E irá passar por aqui. Gerard não deu muita conversa para ela, parece que não tem mais volta mesmo. Disfarça, Isa. Conte-me alguma coisa.
- Pois é, Melanie. John deve estar chegando daqui a pouco, ele chegará de madrugada e eu estou morrendo de saudades dele! – disse a primeira coisa que lhe veio a mente.
- Como o John é? – Melanie indagou, curiosa, mesmo após Rebeca já ter passado por elas.
- Parecido com Erik, lindo como ele! Aliás, faz mais de um ano que eu não o vejo, pois ele estava morando na Austrália. E meu cunhadinho é tão fofo! Espero que Vicky goste dele e não se incomode com sua presença. Falando nela, olha quem chegou!
- Oi Isa, oi Melanie!
- Oi Vicky! – as duas responderam em coro.
- Vamos para a nossa mesa, Melanie? Eu não quero ir sozinha, só tem gente que eu não gosto e outras que eu não conheço, por enquanto. – comentou, reparando nas pessoas.
- Vicky, talvez John chegue de madrugada, ele não deu certeza do horário e pode nos acordar. Não tem problema mesmo?
- Claro que não, Isa. A casa é tua também e ele será muito bem vindo. E pela foto que você me mostrou dele, acho que não eu não me importarei nem um pouco em ser acordada por ele. – gracejou.
- Ele é gato, então? – Melanie indagou, curiosa – Você não me mostrou nenhuma foto dele, Isa. – resmungou.
- Melanie! Ele é muito novinho para ti! E você não me pediu, a Vicky sim.
- Claro, eu queria saber quem era que iria ficar na minha casa, não é? Tinha que dar uma conferida no material antes! – debochou.
- Ah, Isa. Não tem problema se ele for novinho, só posso olhar mesmo. Sou casada, esqueceu? E bem casada. Mas olhar não tira pedaço.
As três riram.
- É, mas eu não sou casada, achei ele gatinho e para mim ele não é novo. – Vicky comentou, sorrindo. – Aliás, para mim ele está no ponto!
- Ai, ai, ai.... Veja lá o que você vai fazer com o pobre do meu cunhadinho, Vicky. Não vai atacá-lo no meio de noite. – zombou.
- Claro que não! A não ser que ele queira me atacar! – riu.
- Bom, meninas, tenho que trabalhar. Olha lá a cara de reprovação de meu patrãozinho atrás do balcão.
As três olharam para Gerard, e ao reparar em sua expressão, deram uma gargalhada.
- Isa, querida, falando em gatinho, meu priminho também está no ponto, não? Bem que você poderia aproveitar que ele está solteiro e dar uns amassos nele atrás daquele balcão!
- Vicky! O que deu em você hoje? Está muito saidinha! – Isa fez cara de ofendida, mas logo voltou a sorrir.
- Prometo que vou pensar seriamente no que você disse.
- Acho que ela prefere o gato do teu irmão, Vicky.
- Verdade, Isa?
- Melanie! – recriminou a amiga, sentindo suas bochechas corarem.
- Olha, ela ficou vermelha! Então é verdade, Isa! Você está mesmo interessada pelo meu irmão? Nossa, adoraria se você fosse a minha cunhada e não aquela chata da Valentine.
- Ah... Hã.... – Isa ficou embaraçada e não sabia o que dizer.
- Isa, agora falando sério! Pode contar comigo, estou adorando morar contigo e já te considero uma grande amiga. Não contarei nada para o meu irmão e se quiser minha ajuda estarei a sua disposição.
- Obrigada. – ela balbuciou, constrangida, e voltou a encarar Melanie com uma expressão indignada.
- Bom meninas, vou ali conversar com o meu priminho, ver se suavizo aquela expressão carrancuda que ele está. Melanie, me espera para irmos à mesa, está bem?
- Claro, Vicky. – Assim que ela se afastou, procurou se justificar – Desculpa, Isa. Saiu sem querer. Quando eu bebo, fico com a língua solta e acabo falando demais. Por isso que o Bill não gosta que eu beba.
- Não tem importância não, Mel. Você já me deu tantos conselhos e foi uma amiga tão boa para mim, que não vai ser isso que irá abalar a nossa amizade. Aliás, por que não aproveita que o Bill ainda não chegou e bebe mais uma cerveja? Desde que mantenha a boca fechada dessa vez. – completou e sorriu.
- Prometo que não falarei mais nada, Isa. – ficou sem graça, arrependida.
- Então sentem, vocês duas, que eu as servirei. – Vicky já estava de volta - Vicky, o que você quer beber? Eu já levo para vocês.
- Vou querer uma cerveja também.
- Bom, meninas, vou trabalhar então.
- Oi chefinho, está brabo comigo?
- Estou. Não te pago para ficar de papo e sim para servir as pessoas.
Isa estranhou o seu jeito de falar, mas resolveu não discutir e manteve-se quieta. Pegou dois copos para servir Melanie e Vicky e correu para anotar o pedido dos outros.
Na mesa de Valentine, que ainda não chegara, estavam três mulheres, entre elas Rebeca, e mais um casal, além de Vicky e Melanie.
- Que demora para nos atender, hein? – Rebeca reclamou, bem desaforada. – Gerard deveria selecionar melhor suas funcionárias. Se fosse comigo, você já estaria na rua.
- Não tem problema Rebeca, nem demorou tanto assim. – uma das amigas interferiu.
Isa engoliu suas palavras em silêncio e pensou:
“Acalme-se, a noite vai ser longa. Respire bem fundo, e acalme-se.”
Anotou todos os pedidos, deixando Rebeca por último:
- E você? O que irá beber?
- Eu? Pergunte ao Gerard que ele sabe. Ele conhece bem os meus gostos.
- Eu estou te perguntando agora. – falou com firmeza – Quem irá te servir sou eu, não Gerard.
Vicky, do outro canto da mesa, abafou uma risada.
Rebeca fuzilou Isa com o olhar e respondeu:
- Pois peça a ele para me servir, então.
- Está bem, se é assim que você quer. – se afastou e logo em seguida voltou com todos os pedidos, menos o dela.
- E para mim? Não trouxe a minha bebida?
- Não, não sei o que você quer. E Gerard está ocupado, não pode vir agora. E ele disse que você é muito inconstante, que não sabe do que você gosta e que não poderia decidir por você.
- Ele disse isso? – indagou, incrédula. E observou Gerard que as observava de longe, com uma expressão indecifrável no rosto. – Pois bem, então me traga uma cerveja.
- Está bem.
Não demorou muito, e voltou com um copo.
- Não essa, eu quero aquela cerveja vermelha. Não gosto dessa.
Isa respirou fundo, tentado se controlar, mas já completamente irritada.
Voltou ao balcão bufando, trazendo a cerveja de volta.
- O que foi, Isa? Rebeca não quis a cerveja?
- Não! Ela disse que não gosta dessa, que quer a vermelha. E se eu servir a vermelha, garanto que ela dirá que prefere essa!
- Deixe que eu a sirvo então, ela não reclamará para mim.
Levou o mesmo copo para ela, que agora ela aceitou com um sorriso nos lábios.
- Pronto! Não foi tão difícil, foi?
- Claro que não, era exatamente isso que ela queria! Tudo o que ela queria era que você levasse a cerveja para ela! – Isa retrucou, desgostosa.
Serviu as outras mesas e logo Gerard chegou perto dela e comentou:
- Desculpa, Isa. Desculpa o modo como falei contigo antes. Não queria ter sido indelicado, mas Rebeca tirou toda a minha paciência.
- E a minha também, mas eu não fui indelicada com ninguém.
- Você tem razão. Me perdoa?
- Como patrão eu não tenho o que perdoar, você tem todo direito de falar comigo assim.
- Como patrão? Quer dizer que você não quer mais ficar comigo?
- Não sei, vou pensar no assunto. – mas logo desviou sua atenção para alguém que chegava - Dilan! Que milagre, você não foi o primeiro a chegar! Aliás, já está bem atrasado, por sinal.
- É! Perdi a hora falando com a tua irmã - sorriu – Sabia que agora nós estamos namorando oficialmente? Estou até pensando em ir ao Brasil semana que vem para revê-la, não vou conseguir esperar até dezembro! Aliás, você não gostaria de ir comigo?
- Eu? Não, se eu for não volto mais. E combinei com Ilana que nós passaremos o Natal aqui, depois eu voltarei para casa.
- Ah.... – ele resmungou – Você voltará mesmo?
- Sim, creio que sim. Tenho que voltar para casa, Dilan. – fez uma pausa e então indagou - Você não vai sentar? Quer alguma bebida? Eu já te levo na mesa, Dilan.
- Ainda não, Isa. Vou esperar minha irmã e Adam aqui mesmo. Viemos juntos, eles só estão estacionando o carro.
- Ah... Bom, mas eu não posso ficar aqui contigo, meu chefinho já está impaciente, porque eu já fiquei muito tempo de papo.
- Oi George, oi Bill.
- Pelo visto chegamos todos juntos! – Dilan exclamou, admirado.
- Bom, Isa. Sentarei com eles então. Traga uma cerveja para cada um, está bem?
- Claro, já levarei para vocês.
Quando estava preparando os três copos para levar, estando de costas para a porta, sentiu alguém esbarrando em seu ombro, quase fazendo com que ela derrubasse os copos. Virou-se para olhar quem era e deu de cara com Valentine e Adam Simons.
- Ah, desculpe Isabela. Quase derrubei os copos, não percebi você. – Valentine fingiu um arrependimento inexistente e Isa fingiu acreditar.
- Feliz aniversário, Valentine. – cumprimentou a outra, imitando seu cinismo.
- Ah, obrigada. Vamos, Adam, sentar com os nossos amigos. – Segurou no braço dele com firmeza e com um sorriso vitorioso no rosto olhou para Isa e pediu duas cervejas.
Adam estava constrangido com a situação. Apenas cumprimentou-a e manteve-se mudo, fitando-a com o canto do olho. Mesmo sentado à mesa, Isa reparou que ele a olhava. Diversas vezes, percebeu que ela a analisava, por mais que tentasse disfarçar.
“O que será que ele quer? Ele que escolheu ficar com ela!”
E a partir daquele momento, servir aquela mesa tornara-se um verdadeiro suplício para Isabela. Toda vez que ela chegava perto: Valentine grudava em Adam! Fazia um carinho nele, trocava um beijo, fazia tudo para que Isa percebesse que ele era dela, que ele estava com ela. E Isa tinha que fingir que não se importava, que não reparava neles. E se sairia muito bem se seus olhos não traíssem seus sentimentos. Mas isso era algo que só quem a conhecia bem poderia perceber. Ou quem estivesse prestando muita atenção nela, como notou que Adam estava.
Ela chegou e sentou no balcão, agora o movimento estava fraco, muitas pessoas já haviam ido embora.
- Hoje você não quer que eu te libere para sentar com eles, estou certo? – Gerard sentou ao lado dele e indagou, perspicaz.
- Não mesmo! Mas gostaria de ser liberada para tomar uma cerveja. Essa duas mulheres me deixaram tão irritada, Gerard, que eu gostaria de um copo para me acalmar. Mas se eu beber, não poderei mais trabalhar, pois certamente a bebida afetará meus reflexos e eu acabarei derrubando um copo, sem querer, numa das duas.
- Sem querer, é? – debochou e chegou mais perto dela.
- Gerard, a Rebeca está olhando para cá, não chega tão perto assim. – procurou se afastar.
- É com a Rebeca que você está preocupada, ou com o meu primo, que não para de olhar para cá? Aliás, não sei como a Valentine não percebe que ele não tira os olhos de você.
- E quem disse que ela não percebe? Por que você acha que ela me odeia?
- É verdade, por isso ela gruda nele para marcar o território dela.
- É. – comentou e sorriu sem graça. – Chegaria a ser engraçado, se não fosse patético.
- Eu não acho engraçado, Isa. Não acho a menor graça em gostar e não ser correspondido.
- Gerard, acho que você está confundindo um pouco as coisas.
- Como assim?
- Pelo que eu percebi, você está acostumado a ter todas as mulheres aos seus pés e só porque eu estou agindo diferente, você pensa que gosta de mim. Só porque você não pode me ter.
- Então quer dizer que eu não posso te ter?
- Fisicamente até pode, mas meu coração pertence a outro. Aliás, já tenho dois amores em meu coração, não tem espaço para você.
- Aprecio a sua sinceridade, Isa. Pessoas sinceras hoje em dia são raras.
- Eu sei. – olhou para ele e sorriu.
- Que saco! – ele resmungou.
- Que foi?
- Meu primo não tira os olhos de você, desse jeito não terei chance nenhuma!
Ela deu uma gargalhada, chegando perto dele, encostando a cabeça em seu ombro, mas mantendo o olhar para frente.
- Você é legal, Gerry. Me diverte e me faz rir.
- Então quer dizer que eu tenho cara de palhaço? – zombou.
- Claro que não, seu bobo. E então, Gerard? Posso tomar uma cerveja ou ainda terei que servir as tuas amiguinhas?
- Minhas amiguinhas? Pode tomar tua cerveja e depois servi-las, se quiser. Por que se derrubar bebidas nelas depois, eu darei boas risadas observando essa cena daqui.
- Que maldade, Gerard. Mas eu não faria isso de propósito, não sou vingativa.
Isa levantou e serviu-se um copo, sentando novamente ao lado de Gerard.
- Recém sentei para beber e já estão me chamando. Vai dizer que não é de propósito? Gerard, você me deu folga, não vou lá não.
- Está bem, pode deixar que eu vou. Quem sabe se eu te tratar bem, conquiste um lugar no teu coração?
- Ah... – ela resmungou.
Ele sorriu.
- Estou brincando, Isa. Não se sinta pressionada.
*
- Acho que eu vou embora, minhas amigas já foram, não tenho mais o que fazer aqui e está ficando tarde. – comentou assim que ele voltou a se sentar com ela.
- Está bem. Mas antes vai lá naquela salinha para mim olhar o estoque, preciso saber quantas cervejas ainda temos para eu pedir mais para Adam.
- Você quer que eu conte as tuas cervejas? – indagou, surpresa, porque isso era algo que ele mesmo gostava de fazer.
- Sim, por favor.
- Está bem.
*
Assim que Isa saiu, Gerard chamou Adam para conversar, com o pretexto de falar sobre as cervejas, mas com a real intenção de afastá-lo de Valentine.
- Adam, venha cá, preciso conversar com você.
Levou-a até a sala onde Isa estava e fez com que Adam entrasse, trancando os dois lá dentro.
- Pronto! Agora vocês dois irão conversar e eu não os deixarei sair até que resolvam de uma vez por todas essa situação. Ah, estarei aqui de guarda para o caso de Valentine aparecer.
- Adam! – Isa exclamou espantada ao virar de costas e perceber que estava sozinha com ele.
- Isa? Você não tem nada com Gerard mesmo? – ele se aproximou e fez essa pergunta. Sabia que não era a melhor maneira de iniciar um dialogo, mas a dúvida lhe consumia.
- Você não acreditou em mim antes, por que acreditaria agora?
- Porque eu preciso saber a verdade, Isa.
- A verdade é que... Eu não tinha nada com ele, mas agora não sei bem.
- Como assim, não sabe?
- Por que a gente se beijou hoje de novo, Adam. Pela segunda vez.
- Hum...
- Eu sou livre e desimpedida, Adam. Lembra que você me disse isso uma vez? Jogou essas palavras na minha cara, lembra?
Ficaram em silêncio e ele enfim falou:
- Então eu não quero mais ficar com você, Isa. Não quero disputar uma mulher com meu primo.
Ela ficou morrendo de raiva.
- Disputar mulher com seu primo?!! Mas ele é muito mais homem do que você jamais será! Você fica com Valentine mesmo sem gostar dela, ele pelo menos teve a decência de terminar com a Rebeca! Você é um fraco, que não sabe ficar sozinho! E sou eu que não quero você, Adam. Nunca mais! Agora volte lá para a sua querida namorada! Você a preferiu, nem deveria estar aqui comigo! Vocês dois se merecem!
- Por mim eu nem estaria aqui! Cai numa armadilha tua e de Gerard. Vocês que me atraíram para cá!
- Uma armadilha minha? – ela gritava, exasperada – Era só o que faltava agora, ter que ouvir isso! Gerard, abre logo essa porcaria de porta que eu quero sair, não quero ficar aqui nem mais um minuto! – bateu na porta com força, esmurrando-a e fazendo um barulho alto, e ele logo abriu. Passou por ele feito um raio e correu para rua. Saiu tão apressada e correu tanto que quando se deu conta já estava na porta de casa.
“Que raiva”- bufou –“Mas eu não vou derrubar nenhuma lágrima por ele! Ele não merece! Eu o odeio!”
*
- Por que você fez isso, Adam?
- Isso o quê?
- Por que você tratou Isabela dessa maneira? E por que você está namorando a Valentine? Adam, o que você sente por Isa e o que ela sente por você, é visível a todos. Só não percebe quem não quer. E isso é tão raro, meu primo. Não perca isso, é tão difícil de encontrar. E Isabela não é qualquer uma, ela é uma mulher muito especial.
- Tão especial que te conquistou e tirou o lugar de Rebeca. – ele resmungou.
- Sim, confesso que estou interessado nela, mas ela só tem olhos para você. Ela está apaixonada por ti.
- É? Como você sabe disso? – indagou interessado.
- Por que ela me disse.
- E mesmo assim, ela permitiu que você a beijasse! Como posso confiar numa mulher como ela?
- Ela te contou, é?
- Sim...
- E como você pode desconfiar dela? Ela não precisava ter te contado isso e você jamais saberia. Mas hoje ela estava triste, porque veria você com Valentine e eu fui consolá-la e então rolou o beijo... Não foi nada planejado, simplesmente aconteceu. E ela deixou claro desde o princípio que é de você que ela gosta.
- Hum... E naquele dia que eu cheguei e vocês estavam quase um nos braços do outro? O que foi aquilo, Gerard?
- Eu estava com raiva, pois percebi pela primeira vez o interesse dela por ti. Então estava praticamente forçando-a a me dizer como ela se sentia e na hora que você chegou, estava confessando a ela os meus sentimentos. Penso que a peguei de surpresa e a deixei sem reação, e então você nos viu. E depois, quando você saiu, ela me disse que gostava de ti.
- É verdade mesmo? Você não está mentindo para mim?
- Por que eu faria isso, primo? Se eu estou te dizendo que gosto dela e a queria para mim? Por que eu faria questão de te mentir para que vocês ficassem juntos?
- Não sei, realmente não faz sentido. – fez uma pausa, para refletir - E agora? O que eu faço com Valentine?
- O mesmo que eu fiz com a Rebeca. – sorriu.
- Mas hoje é o aniversario dela, não posso fazer isso hoje.
- Então espere até amanhã.
- Está bem, vou pensar. Obrigado, Gerard.
**
Capítulo 11
*
John chegou no meio da madrugada e Isa e Vicky, que dormiam, não o ouviram chegar. A chave da casa estava escondida sob uma pedra perto da porta de entrada, conforme eles haviam combinado. E assim que Isa levantou, encontrou-o dormindo no sofá da sala. Parou em frente a ele e ficou observando-o dormir. Automaticamente, seus olhos se encheram de lágrimas ao constatar o quanto ele estava parecido com o Erik. Vicky também despertou e logo postou-se ao seu lado.
Com um sorriso nos lábios, cochichou no ouvido de Isa:
- Como ele é lindo, não é?
- É sim. – respondeu, enxugando os olhos úmidos.
- O que foi, Isa?
- Saudades do Erik, Vicky.
- Ai, amiga. Não fica assim. – ela a abraçou, tentando consolá-la.
- Não se preocupe, Vicky. Estou feliz porque o meu irmãozinho está aqui. Quando nós começamos a namorar, eu e o Erik, John tinha apenas 14 anos. Eu o vi crescer e ele é como se fosse meu irmão também. Vamos acordá-lo, Vicky? Vamos fazer um super café da manhã para ele e depois acordá-lo? Eu estou louca para conversar com ele! – exclamou, empolgada, mas falando baixinho.
- Claro! Isso se a Meggy não acordá-lo antes. Aliás, cadê ela?
- Ah... Aquela preguiçosinha ainda está dormindo. Você acha que ela é burra para sair de debaixo das cobertas com esse frio?
- Não, burras somo nós. – sorriu. – Venha, Isa. Vamos fazer um café novinho e umas torradas para ele. Nada melhor do que acordar com um cheirinho de café recém passado.
Encaminharam-se para a cozinha e por mais que tentassem não fazer barulho, John acabou despertando.
- Isa, você está ai? – indagou ao se espreguiçar, durante um bocejo.
- John! Você está acordado! – correu para abraçá-lo e se jogou em cima dele.
- Calma, Isa. Assim você está me esmagando! – debochou e sorriu.
- Que saudades, seu chato! – beijou-o no rosto e depois deu um beliscão em sua bochecha.
- Ai! Sua chata! – sorriu – Deixa eu olhar para você, Isa. Nossa, como você está bem! Da última vez que eu te vi você estava magra demais, parecia um esqueleto – fez uma careta e ela mostrou a língua para ele.
- Que bom que você está aqui, estou tão contente por te ver!
- E vai ficar ainda mais quando vir tudo que eu trouxe para ti.
- Oba, presentes! Eu adoro presentes! – ela exclamou, esfregando as mãos.
- Hum... Que cheirinho bom! Quem está na cozinha?
- É Vicky, ela está fazendo o nosso café.
- Ela é bonita? – indagou, interessado.
- Ah, seu safado! Ela é muito bonita, mas não é para o teu bico não.
- Hum. Ela nem deve ser bonita nada. Você cansou de me apresentar as tuas amigas, dizendo que elas eram bonitas e quando eu as vi – fez uma cara de nojo – Argh!
- Você que é muito exigente! – riu - Mas eu duvido que você não ache a Vicky bonita. Ela é linda!
- Ah é? – esticou o pescoço e tentou enxergá-la, mas a porta da cozinha estava fechada.
- Meggy! Você acordou, sua preguiçosa! – A cachorrinha apareceu na sala com a cara toda amassada.
- Meggy! Venha cá! – John a convidou e ela não teve duvidas e logo subiu no sofá, fazendo festa para ele. – Será que ela me reconheceu?
- Não sei. Ela não costuma subir no colo de quem ela não conhece – Isa comentou um pouco surpresa.
Ela logo se alinhou no colo de John.
– Acho que é porque você é parecido com o Erik... – afirmou com melancolia.
- É, deve ser... – ambos ficaram em silêncio – Eu sinto tantas saudades daquele chato, Isa – ele resmungou – Mas a vida continua, não é mesmo? E onde quer que ele esteja, deve estar melhor do que a gente.
- É, deve estar. Eu espero que esteja... – ela murmurou. – E como estão tua mãe e o teu pai? E o que você veio fazer aqui, Johnny? (esse era o apelido carinhoso pelo qual ela costumava chamá-lo).
Ele riu.
- Faz tempo que ninguém me chama de Johnny. – sorriu.
– Que bom que pude vir aqui te ver, estava com saudades. Pois é, Isa... Vim para passar um tempo com os meus amigos em Londres, mas antes passei aqui para te visitar. Eu voltei da Austrália pretendendo ficar em casa com meus pais, mas não consegui agüentar. Minha mãe está louca! Completamente insana! Eu até entendo e não a julgo, mas não posso viver daquele jeito.
- Coitadinha dela, John. Ela perdeu um filho... Deve ser muito difícil para ela.
- Mas eu também perdi um irmão e você um marido e nós estamos vivendo a nossa vida normalmente.
- Eu... Eu não acho que estou vivendo minha vida normalmente, John... Estou tentando, mas também andei fora do ar por um tempo, aliás, ainda me sinto meio perdida sem ele... E se estou aqui agora, talvez seja para fugir um pouco da realidade... – fez uma pausa, pensando - Mas o que tua mãe te fez?
Ele suspirou.
- Sei que é horrível o que eu vou dizer, mas minha mãe precisa de um tratamento psiquiátrico com urgência! O tempo que eu fiquei com eles, quase surtei, quase enlouqueci! A cada passo que eu dava, tinha que dizer onde eu estava. Não conseguia sair à noite, não podia ir numa festa em paz, que ela me ligava a cada cinco minutos.
- Cinco minutos? Ah, também não exagera.
- É, não eram cinco minutos, mas era quase isso. – suspirou, desgostoso. – E eu queria ficar com eles, sabe? Sei que eles precisam de mim por perto, sei que eles sentem falta de um filho, mas se eu ficasse por mais tempo lá, iria pirar. E eu não posso pirar, Isa! Também é difícil para mim, sabe? Ou você acha que eu não sinto a falta do Erik? Ele era meu único irmão!
- Eu sei, Johnny.
- Por isso eu fugi, por isso fui morar na Austrália. Sei que parece egoísmo da minha parte, mas eu precisava de um tempo. Precisava respirar!
- Eu sei como você se sente... Por que você acha que eu vim para cá? Por que você acha que eu estou aqui agora?
- Que bom que você me entende, Isa. Penso que você é a única pessoa que me entende. Minha mãe quase enlouqueceu quando eu disse que partiria.
- E teu pai?
- Meu pai é uma incógnita para mim. Ele não fala nada, fica na dele, não demonstra nada e evita falar no Erik, como se ele nunca tivesse existido. Meu pai parece que não sente nada. Parece que sequer se importou quando eu disse que iria embora de novo.
- É o jeito dele, John. Cada um sofre de um jeito.
- Mas eu estou vivo! Erik não era o único filho dele! – exclamou, exaltado.
- John, dê um tempo a eles. O tempo é o melhor remédio. Com o tempo tudo se ajeita.
- Eu sei, mas parece que ninguém se lembra de mim.
- Tua mãe se lembra de ti, ela não te liga a cada cinco minutos?
Ele achou graça.
- Só você mesmo para me fazer rir disso, Isa. Estava com saudades. – pegou na mão dela, fazendo um carinho.
- E os meus presentes? Cadê eles?
- Pega aquela sacola verde ali. Nela só tem coisas para ti.
- Sério! Toda aquela sacola é para mim? – abriu um sorriso de orelha a orelha ao receber a confirmação.
- Até parece criança, Isa! Nunca ganhou presentes? – ele debochou.
- Ganhei, mas um monte assim... – comentou abrindo a sacola e tirando os pacotes de dentro, sorrindo feito criança – só no meu aniversário e no natal!
- Isa, o café está pronto. – Vicky abriu a porta da cozinha e apareceu na sala pela primeira vez, quase imperceptível.
- Vicky? – Isa tinha esquecido completamente da amiga na cozinha.
- Nossa, quanto presente! – Vicky exclamou, sorrindo. – O que será que são? Abre de uma vez, Isa. Estou curiosa.
- Oi! Eu sou John, prazer. – ele interrompeu a conversa e se apresentou, visto que Isa esquecera de fazê-lo.
Vicky ficou sem graça e respondeu timidamente.
- Oi....
- Vicky, esse é o John. John esta é a Vicky. Agora que vocês já estão devidamente apresentados, posso abrir meus presentes?
- Mas as torradas vão esfriar! – Vicky exclamou. – Depois vocês dirão que não gostaram.
- Venha, Isa. Vamos comer. Os presentes não irão fugir. – John se levantou, tirando a Meggy de seu colo.
Como ele falou em português, Vicky não entendeu nada e ficou olhando de um para o outro, visivelmente desanimada. Não queria ser excluída da conversa.
- Hum.... Você não é americano? – Vicky resmungou para o John.
- Sim, embora eu me considere brasileiro, pois moro no Brasil desde os 4 anos. Por quê?
- Ah, não fala em português não... Eu não entendo...
Ele deu uma gargalhada.
- Você tinha razão, Isa. Ela é linda! – comentou em português, para implicar com Vicky.
E riu mais ainda.
- O que ele falou, Isa? – Vicki questionou fazendo uma carinha triste.
- Nada, Vicky. Nada de interessante.– Isa sorriu.
- Ah... Se vocês vão ficar me excluindo da conversa, ou se querem ficar sozinhos, eu posso ir para a casa do meu irmão... Ele me convidou para almoçar com ele e eu não quero atrapalhar vocês...
- Você não vai atrapalhar, não. – John respondeu – Venha, vamos comer as torradas. Devem estar ótimas. – John comentou, galanteador, e sorriu para ela. Vicky então relaxou e sorriu de volta para ele, timidamente. Não tinha como resistir àquele sorriso tão encantador.
Isa percebeu o clima entre os dois, o interesse mutuo e os olhares disfarçados de ambas as partes.
- Vocês podem indo, eu não estou com fome. Quero abrir meus presentes.
- Ah, mas eu quero ver. Leva para a cozinha então para a gente ver junto.
- Está bem, Vicky. Vêm Meggy. – chamou a cachorrinha que levantou correndo e a seguiu.
Sentou em uma cadeira e a afastou da mesa, para não sujar os pacotes.
- Isa, quase me esqueci! Aquela caixinha ali minha mãe pediu para você só abrir quando estiver sozinha.
- Sério? O que será que é? – indagou, entre curiosa e ansiosa.
- Não sei, ela não quis me falar. – respondeu e então se virou para Vicki - Sabe, Vicky, minha mãe sempre fez questão que falássemos em inglês em casa, para não esquecermos o nosso idioma. E eu, quando criança e mais ainda quando adolescente, odiava! Porque queria ser normal e ser como os outros garotos que falavam em português em casa. Mas hoje eu agradeço muito a ela. Se não fosse por isso, eu não poderia estar falando agora com você, por exemplo. E não poderia ter morado na Austrália e muito menos poderia ir para Londres, como irei na semana que vêm. Eu nunca gostei de estudar, nunca falaria inglês com fluência como eu falo.
- E eu tive que aprender na marra para falar com eles – Isa riu, enquanto abria o primeiro pacote.
- Sim! Minha mãe não abria exceção nem para a Isa, disse que seria bom para ela também.
- E foi mesmo! – sorriu, tirando uma blusa de gola alta lilás do pacote, de uma malha bem grossa.
- Nossa, que linda, Isa! – Vicky que até então se mantinha calada exclamou ao ver a blusa.
- É incrível como vocês mulheres adoram ganhar roupa – John comentou de boca cheia, mastigando a torrada. – Não tem como errar!
- Tem sim! É só dar uma roupa feia! – Vicky retrucou, já a vontade com ele.
- E tem um cartão. – Isa comentou, abrindo. – Ah, é da minha mãe. Querida! Que saudades dela! Ela disse que aqui faz muito frio e que eu tenho que me preparar. Ah, e disse que me mandou uma meia calça de lã também. Deve estar em um desses outros pacotes.
- E faz frio mesmo, muito frio! – Vicki admitiu - Espere só para ver.
- Agora vou abrir esse grandão.
- Esse é da minha mãe. – John disse, esticando a cabeça para ver melhor, curioso.
Isa abriu e tirou um casaco de lã dentro, da cor marrom, que ia até acima dos joelhos.
- Que lindo, Isa! Nossa, John! Como a tua mãe tem bom gosto! – Vicky falou.
- Deve ter custado uma fortuna, John! Tenho que ligar agora mesmo para ela para agradecer!
- Não ligue ainda, Isa. Você ainda não abriu aquela caixinha, lembra? E parece que tem uma carta para ti dentro dela.
- Ah, é? Uma carta? Vou lá em cima ver então.
- Ah não, Isa. – Vicky resmungou. - Abre os outros pacotes antes. Só faltam três e eu quero saber o que são
- Ah, vocês mulheres são mesmo curiosas. – John riu.
- Está bem.
- Abre aquele que é o maior. – Vicki pediu.
- Esse é de Ilana – Isa viu o nome no pacote – Uma bota marrom!
- É para combinar com o casaco, Isa. Você vai ficar muito elegante. Que chique, amiga!
- Pois é... Agora eu estou louca para que o frio chegue logo.
A bota era de cano alto, bico fino e com um salto de mais ou menos 8 centímetros de altura.
- Esse é a meia calça que minha mãe falou e esse é de Ilana para você, Vicky.
- Para mim? – falou com os olhinhos brilhando. Pegou rapidamente o presente, abrindo o pacote com afobação. – Que brinco lindo, tão diferente!
- Diferente? Para mim é tão comum. – John comentou.
- Ah... Eu adorei! – disse, sem jeito.
- Que coisa mais chata, John. É comum no Brasil, pois é de uma pedra brasileira, mas é diferente aqui. Você vai fazer sucesso, Vicky. Não dá bola para esse estraga prazeres. – mostrou a língua para ele.
- Eu não darei mesmo, eu adorei! Agradece a tua irmã por se lembrar de mim, Isa. – correu para frente do espelho para pôr o brinco novo. – E então, gostou?
- Claro, Vicky. Ficou muito bonito.
- Eu também gostei. – John comentou, fitando-a com atenção. A pedra azul combinou bem com os fios loiros de Vicki.
- Mas você não disse que era comum? – Vicky implicou.
- Comum, mas são bonitos. E ficaram bem em você. – lançou-lhe um olhar tão profundo que fez com que Vicky ficasse embaraçada e desviasse os olhos dos dele.
- Bom gente, o papo está bom, mas eu vou subir para ver o que a minha sogra me mandou. Quer dizer, ex-sogra... Ou é minha sogra ainda? Nem sei mais... Também não tem importância, não é?– comentou, confusa. - Bom, vou subir. Vem Meggy!
A cachorrinha saiu correndo atrás da dona e Isa pegou-a no colo ainda nas escadas.
- Meggyzinha querida, não sei o que irei encontrar nessa caixinha... Talvez mamãe precise de você... Fica comigo, está bem? – pediu, ansiosa, abraçando e apertando a cachorrinha em seu colo. E como resposta, obteve um olhar de Meggy, que parecia entender e concordar.
Isa sentou-se na cama, ansiosa, com o coração batendo apressadamente. Abriu a caixa rapidamente e encontrou uma carta e um pequeno pacote fechado, que ela não fazia idéia do conteúdo. E por mais que quisesse abri-lo e estivesse muito curiosa para ver o que era, respeitou o desejo de Sarah, que escrevera no papel: “Leia antes de abrir.”
Desdobrou o papel e iniciou a leitura.
*
“Querida Isabela:
Finalmente tomei coragem e resolvi abordar esse assunto que eu guardo comigo há algum tempo. Não tivemos oportunidade de falar sobre isso e eu também estava adiando esta conversa, pois é algo muito dolorido para mim, como acredito que deva ser para você também. Mas agora penso que está na hora de finalmente te contar o que eu sei... Você precisa saber que eu sei. Erik me contou, mesmo contrariando o seu pedido e me fez jurar segredo. Um segredo que inicialmente me deixou muito feliz, até um pouco eufórica, mas que após a sua morte passou a pesar em meu peito. Pois perdi um filho e junto com ele a chance de ser avó, pelo menos de um neto dele.
É isso mesmo, Isa. Espero que não o recrimine por isso, mas Erik me contou sobre seus planos. Contou que vocês haviam decidido engravidar, o que me deixou muito feliz na época.
Sei que não fui uma sogra exemplar, principalmente no início do relacionamento de vocês. Espero que entenda meus atos, eu nunca tive nada contra você, apenas achava que Erik era novo demais para se envolver. E se fiz alguma coisa errada, agora sei que estava errada, era apenas por amor ao meu filho. Peço desculpas, do fundo do meu coração, por não ter apoiado vocês no início. Peço desculpas por tudo que eu fiz de errado. E espero que você me perdoe. Eu perdi meu filho, e não quero perder você, Isabela.
Você para mim é um pedaço de Erik, é um elo que eu quero manter para sempre. E eu te peço, encarecidamente, que mantenhas o contato comigo, que não se esqueças de mim. Erik foi um capitulo apenas da sua vida, mas tenho certeza que você foi a vida inteira para ele. E eu estou muito grata a você, por todos os momentos felizes que você proporcionou ao meu filho. Erik teve uma vida boa e te amou muito e tenho certeza que não poderia ser diferente. Tenho certeza que ele foi muito feliz e saber disso ameniza um pouco a minha dor.
Talvez eu esteja sendo egoísta pedindo para que você mantenha a ligação com a minha família. Talvez assim seja mais difícil para ti se desligar e seguir tua vida.... Mas quero te dizer novamente que você deve seguir tua vida, Isabela. Que deve se casar de novo e procurar ter filhos e que contará com todo o meu apoio quando isso acontecer. Você não deve desistir de ser mãe, Isa. Ser mãe é a melhor coisa do mundo! Mesmo que depois os filhos partam, seja como o John, que vive partindo por vontade própria, ou parta como o Erik para nunca mais voltar.
Desculpa eu te escrever tantas coisas dessa maneira, mas eu precisava desabafar, precisava te falar isso, e acho que pessoalmente não conseguiria dizer nem a metade...
Agora sobre o presente.... Sei que você deve estar curiosa para saber o que eu estou te dando, o que tem neste pacote...
(Falando em presente, espero que você tenha gostado do casaco. Foi uma forma que eu achei de te agradecer por tudo o que você fez pelo meu filho. Espero que sirva e que esteja a seu gosto. Fiquei sabendo que o inverno aí é bem rigoroso, e não gostaria que você passasse frio)
Mas voltando ao outro presente... Por diversas vezes pensei em jogá-los fora, mas nunca tive coragem o suficiente para fazê-lo. Já derramei diversas lágrimas olhando para eles, mas nunca tive força o suficiente para descartá-los....
Foi algo que eu fiz para ti e para o Erik. Na verdade, eu fiz para a Luana ou para o Arthur usarem. Sim, Isabela... O Erik me disse também o nome que vocês haviam escolhido para os bebês... Espero que não fique zangada com ele e o perdoe por não ter mantido o segredo entre vocês. Mas ele estava tão feliz que não conseguiu se conter. Mas tenho certeza que isso não tem importância agora e que você não é capaz de recriminá-lo por ter me contado...
Enfim, eu fiz isso para os filhos de vocês usarem. Fiz escondida do meu marido e de todos, inclusive de Erik. Pretendia fazer o enxoval completo, mas só tive tempo mesmo para isso... E agora resolvi dá-lo a você, Isabela. Eu fiz para você e com você eles devem permanecer. Foi feito para os teus filhos usarem e nada me daria maior satisfação do que ver os teus filhos usando-os um dia. Os teus filhos, mesmo que não sejam mais os filhos de Erik, mas que para mim carregarão um pouquinho dele junto. Por que para mim, você carrega um pouquinho do Erik e carregará para sempre. Sei que você sempre amará o meu filho, mesmo que passe a dividir teu coração com outro amor.
Enfim, Isa, tenho que encerrar essa carta por aqui... Estou muito emocionada e com as mãos tremulas... Não consigo mais escrever...
Bom, pense em tudo o que eu te falei e, principalmente, seja feliz, querida! Eu estou tentando com todas as minhas forças ser feliz também, mesmo que não seja fácil, mesmo que às vezes doa muito, pois sei que meu filho não gostaria de nos ver sofrer.
Um beijo bem grande para você,
Sarah M.Taylor, tua eterna sogra.”
*
Assim como ocorreu com Sarah, Isa terminou de ler a carta com as mãos tremulas. E com as mãos tremulas ficou em dúvida se deveria abrir ou não o pacote. Se era forte o suficiente para isso. Os olhos estavam molhados, sentia uma dor no fundo da garganta e uma dor cortante no peito, mas não era capaz de chorar. Já havia chorando tanto nestes dois últimos anos, que talvez suas lágrimas tivessem secado. Talvez ela não fosse mais capaz de chorar. E como precisava chorar! Precisava descarregar aquele peso que sentia!
Abriu o pacote, relutante e tirou de dentro dois sapatinhos de bebês, feitos de tricô. Um cor-de-rosa e outro da cor azul. Um feito para Luana e outro para o Arthur. Sentiu uma dor tão intensa que levou a mão à boca e mordeu com força, como se a dor física pudesse aplacar um pouco da outra dor. Soltou um grito baixo de dor pela mordida, o que chamou atenção de Meggy.
Meggy se aproximou da dona e lambeu sua mão. Como se suas lambidas, a expressão canina de beijos, tivessem a capacidade de consolar e diminuir a dor. Colocou a cabecinha no colo de Isa e passou a fitá-la, em silêncio. Isa se agarrou à cachorrinha e ficaram assim durante muito tempo, em silêncio e uma consolando a outra. Isa perdeu a noção de quanto tempo permaneceu em seu quarto e acabou adormecendo. Quando acordou, com batidas na porta, ainda portava os sapatinhos de bebê à mão.
Levantou e escondeu rapidamente o “presente” sob o travesseiro. Meio desnorteada, abriu a porta do quarto e se deparou com um inesperado visitante.
- Ah, você está ai? Eu cheguei aqui e não encontrei ninguém, então resolvi procurá-las aqui em cima.
- Adam! – ela exclamou e se jogou nos braços dele. Ele, pego de surpresa, a abraçou também.
*
Capítulo 12
*
- O que foi, Isy? Alguma coisa errada? – preocupado, ele acariciou seus cabelos castanhos. Percebeu que ela estava triste e reparou também que havia uma carta em cima da cama, assim como vários presentes espalhados pelo quarto. Embora estivesse curioso, deixaria que ela abordasse o assunto se assim desejasse.
Meggy latia enlouquecida, se posicionando contra o invasor e protegendo sua dona.
- Para Meggy! – Isa ordenou, ainda agarrada a ele. E então Meggy se acalmou e passou a cheirá-lo. Isabela se afastou um pouco, mantendo o abraço e o encarou.– John e Vicky não estão lá em baixo? – perguntou num fio de voz.
- Não... Eu não vi ninguém.– ele comentou, confuso com a situação. Mas não a largou, pelo contrário, apertou novamente o abraço e a trouxe para junto de si.
Se ela estava triste, ele cuidaria dela. Ele estava ali para falar com ela. Estava decidido a ficar com ela, mesmo que para isso tivesse que lutar contra um fantasma. E ele não estava disposto a desistir, não estava disposto a perder essa luta.
- Entre Adam, entre e feche a porta. Fica aqui comigo. Eu preciso que você fique aqui comigo. – suplicou carente.
Ele fez o que ela disse. Girou a chave na fechadura e os dois se deitaram na cama e ficaram em silêncio. Na mesma cama que já havia sido testemunha de beijos trocados por eles antes dela se mudar. Isa se alinhou em seus braços e colocou a cabeça em seu ombro, encostando seu rosto no rosto dele.
- Você está cheiroso. – ela comentou, deslizando o nariz pelo pescoço dele depois de vários minutos em silêncio.
- Você também.
- Cadê a Meggy? – ela indagou, estranhando o silêncio da cachorrinha.
- Está dormindo nos meus pés.
- Sério? – ela se inclinou para frente para olhar. Espantada, arqueou as sobrancelhas e abriu a boca, mas nada disse.
- O que foi?
- Era assim que ela ficava com Erik! Exatamente assim! – comentou com surpresa. – A Meggy preferiu ficar contigo a ficar comigo!
Ele sorriu e comentou:
- Vai ver ela gostou de mim. – olhou-a no fundo dos olhos e emendou - Ela já me aceitou, agora só falta a dona dela fazer o mesmo. – encarou-a e aguardou ansioso pela resposta.
- Hum... E quem disse que a dona dela já não fez isso?
- Sério?
- Hum rum... Ou você acha que eu deixo qualquer um entrar no meu quarto dessa maneira? – sorriu para ele.
Ele ficou extremamente feliz e não disfarçou sua alegria. Aproximou-se ainda mais dela, chegando bem pertinho de seu rosto. Isa percebeu sua intenção e sorriu de leve. Estava feliz também. Antes de beijá-la, ele fez um carinho em seu rosto, e disse:
- Você é tão linda, Isy. Tão maravilhosa...
Ela se derreteu e fechou os olhos, aproveitando aquela sensação ao máximo.
Adam afastou os cabelos do rosto de Isabela e então aproximou seus lábios. Ele começou uma longa seqüência de beijos: primeiro um na testa, depois desceu para as bochechas. Beijou um lado, depois o outro, suavemente, como se fizesse uma carícia com os lábios. E somente após percorrer toda extensão do rosto, calmamente, chegou à boca. Beijou um canto, depois outro. E sem pressa, depositou os lábios sobre os lábios dela. E antes de aprofundar o beijo, comentou:
- Eu amo você, Isy.
Ela o encarou e sorriu, mas não teve tempo de dizer nada. A única resposta que ela pôde dar foi um suspiro emocionado, pois ele logo a tomou nos braços e aprofundou o beijo. Um beijo que começou suave, mas que em seguida passou a transmitir toda a sua urgência reprimida. Um beijo que em questão de segundos se transformou em faminto, voraz, talvez até um pouco bruto, mas ainda assim extremamente bom. E ela correspondeu da mesma forma.
Estavam deitados na cama, a porta estava trancada e ninguém poderia entrar.
Adam baixou o rosto e a beijou no pescoço, fazendo-a suspirar ainda mais, fazendo-a perder os sentidos e ansiar por mais. Isa arqueou o pescoço, se oferecendo a ele, e inclinou as costas para trás, deixando dessa forma seus seios grudados no peito dele. Seus mamilos automaticamente se tornaram ainda mais enrijecidos, como se implorassem pelo toque das mãos dele. Adam percebeu e desceu as mãos, tocando seus seios ainda sobre a camisa.
Ela aproveitou e colocou a mão sob sua camisa, querendo sentir o corpo dele, e passou a explorá-lo. A pele dele era quente e ele tinha poucos pelos no peito musculoso. Isa, deliciada, iniciou a exploração, do tórax ao abdômen, circundando os mamilos e não perdendo um só centímetro de pele. O peito dele era duro e com um pouco de músculos. Então, com o dedo indicador seguiu a linha de pelos que descia pelo abdômen até que se escondia dentro das calças, para onde sua mão planejava se enfiar. Mas parou ali, pois no mesmo instante ele abriu a camisa dela, sem que ela percebesse. E Isa parou, extasiada, ao sentir a língua dele circundando seus seios. Ficou incapaz de raciocinar por alguns instantes.
Adam, como que hipnotizado, parou para olhar aquele belo par de seios. Pequenos, mas apetitosos. Do tamanho exato para que ele pudesse por todo na boca. Isa ficou olhando para ele, meio que insegura com aquela espécie de exame. Ele era apenas o segundo cara que a via nua. O único após o Erik. Isabela, envergonhada, tentou se cobrir.
- Não, não ouse. – ele sorriu com um olhar apaixonado e impediu que ela colocasse as mãos sobre os seios – Você é linda. É perfeita. – E é minha, ele completou em pensamento.
Percebendo que ela ainda relutava, Adam a beijou novamente, fazendo que ela logo esquecesse de seus temores.
- Eu quero você. – ele admitiu. Estava louco por ela. Completamente enlouquecido.
Isa então decidiu continuar o que fazia antes, e seus dedos voltaram para a região da braguilha das calças dele.
- Eu também quero você. – Ela afirmou quando sua mão tocou na carne rígida. Nossa! Ele era muito... Muito mais do que ela imaginava. Era perfeito! Isa, decidida, fez com que ele removesse todas as peças de roupa. Queria vê-lo nu!
Novamente ele parou para olhá-la, assim que ela ficou sem roupas. E Isa viu além de desejo uma espécie da admiração em seus olhos que parecia mesmo amor. Seria isso possível? Mas não quis pensar. Não iria pensar em nada além daquele momento.
Como se ele lesse seus pensamentos, ele sussurrou:
- Não pense... – e seus lábios voltaram a se unir aos dela. Após alguns minutos, ele baixou o rosto, sua língua e sua boca no pescoço de Isa, sua saliva e seus lábios logo abocanhando seus seios e então, ele desceu ainda mais.
- Não... – ela esboçou uma negativa ao perceber aonde ele queria chegar. Suas mãos tentaram segurar a cabeça dele.
- Deixa... – um pedido numa voz tão rouca e sensual que ela não teve como negar. Isa afrouxou as mãos e enfim soltou. E sem que ela soubesse como tinha acontecido, a língua dele provava o seu sabor, abrindo o caminho entre os lábios de seu sexo. Lambia e chupava como se ela fosse um prato apetitoso. E era bom. Ele devia ser bem experiente, pois sabia como fazer. E Isa gemeu, totalmente a mercê.
- Nossa! Eu quero você! – de repente, ele tinha pressa. Após provar o seu gosto, ele queria se unir a ela! De repente, ele não podia mais esperar. – Isy... – ele subiu o corpo por cima do dela, e quando estava prestes a penetrá-la parou para olhá-la. Estava louco, mas não tanto.
- Hmmm? – ela franziu a testa, abriu os olhos e o encarou, meio confusa. “Como assim? Por que ele parou?”
- Eu não trouxe camisinha.
- Ah...
- Eu não sabia... – ele mantinha-se em dúvidas, mas estava tão pronto para amá-la, tão rígido, que chegava a doer. – Não vim preparado. Eu não imaginava isso...
- Ah... – ela não sabia o que falar. Só o que queria era senti-lo dentro dela. Queria não, ela precisava!
- E então?
- Então? – atordoada, ela não conseguia raciocinar.
- Eu posso?
- Ah! Pode sim! – depois ela pensaria nas conseqüências, agora só o que conseguia pensar era em tê-lo dentro dela!
Estavam tão envolvidos um com o outro, tão entregues um ao outro, que haviam esquecido completamente do resto do mundo. Naquele momento nada mais importava, só o que eles faziam. Não lembravam que Vicky e John poderiam chegar a qualquer momento. Não lembravam que não estavam completamente sozinhos. Mas foram interrompidos antes que pudessem consumar o seu amor, antes que pudessem se entregar completamente um ao outro. Foram interrompidos por tímidas batidas na porta, que os fizeram parar o que faziam e se olhar, assustados.
- E agora? – Isa indagou baixinho, levantando e se vestindo apressadamente.
- Agora você atende a porta, não precisamos nos esconder. Não estamos fazendo nada de errado. – ele sussurrou.
- Isa? Você está bem? – ouviu a voz de Vicky e ficou um pouco menos tensa, respirando mais aliviada. Não queria que John a encontrasse com outro homem. Não ainda, antes de saber o que ele pensava, antes deles conversarem. – Tem alguém com você?
- Vicky? – ela abriu somente uma fresta da porta, para que ela não pudesse olhar para dentro. – O John está contigo? – indagou, apreensiva.
- Não, ele está lá embaixo. – respondeu confusa. – Saímos para almoçar e ele não me deixou te acordar, Isa. Disse que você queria ficar sozinha e como ele te conhece melhor do que eu, não quis contrariá-lo. Mas a gente trouxe comida para ti. Você ainda não comeu nada, nem comeu a torrada que eu fiz. – Vicki demonstrou sua preocupação.
Ouviram um barulho vindo de dentro do quarto. Adam esbarrou em algo enquanto se vestia, deixando cair entre outras coisas o travesseiro.
- Isa, quem está ai com você?
Isa saiu do quarto, fechou a porta atrás de si, e foi para o corredor com Vicky. Não queria que Adam ouvisse.
- Vicky, não fala nada para o John, por favor. Eu te imploro!
- Claro, Isa. – pegou em suas mãos, para acalmá-la.
- Eu... Eu estou com o teu irmão, Vicky.
Vicky arregalou os olhos, boquiaberta.
- E eu interrompi vocês, que vergonha!
- Não Vicky, não tem importância. Você me fez até um favor, pois eu não quero que John nos veja. Será que você pode sair com ele de novo? – suplicou - Inventa uma desculpa, diz a ele que eu estou dormindo! Sei lá... Inventa qualquer coisa, mas leve ele para sair de novo! Não quero que ele veja o Adam saindo do meu quarto. Por favor, Vicky. Me ajude!
- Claro, Isa. Mas não fica nervosa desse jeito. Eu queria mesmo levá-lo para comer uma torta ali na padaria. Vou dizer que você ainda está dormindo, mas que daqui a pouco descerá para comer. E então vou convidá-lo para comer a torta.
- Ele gosta de morangos, Vicky. Convide-o para comer uma torta de morango, que ele não irá resistir.
- Está bem. – ela sorriu para amiga - Agora se acalme que tudo dará certo.
- Obrigada, Vicky.
Voltou para o quarto e levou um susto ao perceber Adam sentado na cama, completamente vestido, com um semblante enigmático e segurando os sapatinhos de bebê na mão que ele havia encontrado sob o travesseiro.
Ela ficou perplexa, parada junto à porta, sem saber o que dizer. Sem saber como explicar o que ela fazia com aqueles sapatinhos de bebê.
- O que é isso, Isabela?
- Sapatos... – foi a única resposta que ela conseguiu dizer.
- Isso eu sei, mas para quê? Você está grávida e eu não sei?
- Não... – ela respondeu, confusa – A minha sogra, quer dizer, a Sarah, a minha ex-sogra, mandou para mim, para os meus filhos... – se embaralhou com as palavras, sem saber direito o que dizia. – Quero dizer, para os filhos que eu possa vir a ter... Um dia... Se eu tiver...
- Você toma pílula, Isa?
- Hum...?
- Anticoncepcional? Você toma?
- Não... – ela balbuciou. Havia parado de tomar para engravidar do Erik e nunca mais voltara a usá-los. Não precisava mais deles.
- Então era para isso que você me queria, não é?
- Hum...? – indagou, atordoada.
- Foi tudo planejado? Não foi? Você me seduziu para que eu te desse um filho? Por que você disse que eu podia continuar, que estava tudo sob controle. Você me fez pensar que você estava se protegendo! Para que? Para engravidar sem o meu consentimento?!!
- O quê? – ela não conseguia entender o que ele dizia, estava atordoada, não conseguia refletir, não conseguia se explicar. Estava nervosa porque não queria que John os visse sem que eles tivessem antes uma conversa e agora estava nervosa também com o interrogatório sem sentido que o Adam lhe fazia.
- Você iria me fazer ser pai sem o meu consentimento? Ou simplesmente fugiria depois para o Brasil carregando o meu filho sem sequer me contar? – ele a encarava com irritação - Hein, Isabela? Qual era o seu plano? Você pode me dizer?
- Plano? Eu não tenho plano nenhum... Você está entendendo tudo errado... Isso foi um presente. – ela gaguejava, atrapalhada.
Mas ele não queria ouvir mais nada. Estava tão furioso que não prestava mais atenção às palavras dela. Depois de andar de um lado à outro, e ser seguido pela Meggy pelo quarto - que estava agitada pois não gostava de brigas - ele decidiu ir embora.
- Sim! Eu sou um idiota mesmo! Eu te disse que te amava, mas você pelo menos não me mentiu. Pelo menos não disse que me amava também. Não! Lógico que não! Você só queria engravidar, não é?
- Adam...
Ela tentou se explicar, mas ele não permitiu. Elevou a mão ao alto, fazendo um gesto para que ela se calasse. Então saiu e bateu a porta e Isa não teve forças para ir atrás dele. Simplesmente deixou-se cair na cama, procurando respirar fundo para se acalmar.
Mantinha apenas um pensamento em sua mente:
“Eu desisto. Realmente, não é para ser. Não é para ser... Só pode! Não vou mais insistir nisso, não quero mais... E depois, de que adianta insistir nisso se eu já estou com a passagem de volta comprada? Só para ter que dizer adeus de novo e me magoar novamente? Não. Dizer adeus uma vez já foi o suficiente.”
*
Capítulo 13
*
Isa desceu para almoçar e comia calmamente quando percebeu que John e Vicky estavam de volta. Eles conversavam com animação e davam risadas altas.
- Isa! John já te contou o que ele fazia na Austrália?
- Não, o que ele fazia? – indagou sorrindo, diante da alegria entusiasmada e contagiante de Vicky, que respondeu por ele:
- Ele trabalhou numa pizzaria, sabia? Fazia toda a pizza, inclusive a massa! E hoje à noite ele prometeu que fará uma pizza para nós. Ah, e também trabalhou como pintor...
- Sim, eu pintei algumas grades e portões! – John a interrompeu, sorrindo.
- Cortou grama, trabalhou como pedreiro... Fez de tudo um pouco. – Vicki discorreu empolgada.
- Cortou grama, é John? Então acho que precisaremos dos teus serviços, já viu o estado do nosso jardim? – Isa debochou.
- Vi sim. E terei o maior prazer em arrumá-lo.
- Não precisa se incomodar, John. – Vicky comentou sem jeito – a gente contrata um jardineiro.
- É, John. A gente contrata um jardineiro, eu estava só brincando. – Isa justificou-se.
- Que é isso, gente. Eu terei o maior prazer. Isa, amanhã você trabalha?
- Não, John, eu nunca trabalho aos domingos. É o meu dia de folga.
- Então está decidido! Amanhã faremos um mutirão para arrumar o jardim, nós quarto.
- Nós quatro? – as duas indagaram, olhando confusas para ele.
- Sim, nós três e a Meggy! – ele deu uma gargalhada – Ou vocês acham que eu vou deixá-la de fora? Ela também terá que ajudar.
Todos riram.
- Então está combinado! – Vicky prosseguiu – Sairemos assim que a Isa terminar de comer para comprarmos todo o necessário para fazermos a pizza e para arrumarmos o jardim. Ah, Isa. Quase ia me esquecendo, trouxemos um pedaço de torta para ti.
- De chocolate, como você tanto gosta. – John acrescentou, com simpatia.
- Ah, muito obrigada! Estou louca por um doce. – ainda estava ansiosa por causa do ocorrido a pouco com Adam e quando algo assim acontecia, ela tinha compulsão por doce. – Mas vão vocês, eu gostaria de ficar em casa.
- Ah não, Isa! Não tem jeito de eu te deixar sozinha aqui de novo! Ou você vai com a gente, ou ninguém vai. – Vicky cruzou os braços e sentou-se à frente dela, fitando-a com uma expressão insistente. - Vamos com a gente, Isa? – se esticou para frente e segurou-a pelo braço, sacudindo-a, enquanto fazia o pedido, fazendo com que Isa achasse graça.
John assistia a tudo em silêncio, admirado com a capacidade de Vicky de animar sua ex-cunhada.
- Está bem, Vicky. Se você insiste, é só o tempo de eu acabar de comer e de me arrumar. – sorriu.
- Isa, te dou todo o tempo do mundo, não estamos com pressa. – fez uma pausa, pensando, e olhou para o John e indagou, sorrindo – John, vamos olhar o jardim para ver o que precisaremos comprar? E vamos também fazer uma lista de compras para a pizza? Para não esquecermos de nada? Uma vez eu combinei com as minhas amigas de fazermos um pão e eu esqueci de comprar o fermento – riu, sem graça – Imagina, fazer pão sem fermento!
- Realmente, é impossível – Isa riu, enquanto se preparava para iniciar o ataque à torta.
- Pois é, eu não quero correr esse risco – pegou um papel e uma caneta – Vamos John, diga tudo o que precisaremos!
- Que menina organizada. E também mandona, não é Isa? - ele gracejou.
Isa assentiu, fingindo uma seriedade inexistente, para implicar com ela.
- Ah, seus chatos! Não me incomodem! – Vicky resmungou.
John então chegou perto dela, posicionando-se em suas costas, e passou a enumerar todos os ingredientes, compenetrado, tentando não esquecer de nada.
- E agora vamos lá para fora ver o jardim. Venha, John! Venha, Meggy!
- Sim senhora! – ele zombou, batendo continência, enquanto obedecia e seguia Vicky pela casa.
Isa ficou sozinha na cozinha e terminou de comer sua sobremesa em silêncio, tranquilamente e sem pressa. Ao terminar de comer, subiu lentamente as escadas, rumo ao seu quarto, embora não quisesse voltar para lá. Mas precisava se arrumar e suas coisas estavam todas lá.
Abriu a porta e entrou, mesmo sem vontade, mesmo desanimada. Constatou que estava tudo uma bagunça, tudo do jeito que ela deixara, na urgência de sair logo dali: os presentes ainda jogados pelos cantos, a cama ainda desarranjada... Olhou para a cama e lembrou-se de Adam com saudades. Suspirou e levou à mão aos lábios, pensando nos beijos trocados, já sentindo falta da boca dele sobre a sua. Olhou-se no espelho, procurando qualquer vestígio dele sobre ela. Algo que demonstrasse que ele estivera mesmo ali, que não havia sido um apenas sonho. Mas nada encontrou. Talvez fosse melhor assim... Não queria lembrar dele, não queria sequer pensar nele. Depois tudo ficaria mais difícil. Depois ficaria mais difícil de partir. E ela precisava partir, pois isso não era algo que dependesse apenas de sua vontade.
E com esses pensamentos tristes, mas firmes e decididos, estava quase acabando de se arrumar quando ouviu tímidas batidas à porta. E ela reconheceu as batidas. As mesmas batidas que haviam interrompido ela e Adam há apenas algumas horas atrás. As mesmas batidas que os haviam separados e evitado aquilo que naquele momento parecia inevitável. E embora Isa estivesse agradecida pela interrupção, por não ter se entregue tão facilmente à Adam, – ou tentasse se enganar, fingindo mentalmente um agradecimento inexistente- seu corpo ainda pedia pelo corpo dele.
Talvez tivesse sido melhor se Vicky chegasse apenas depois. Ou mesmo se não ela chegasse nunca, permitindo que eles ficassem sozinhos, permitindo que ela estivesse ainda nos braços dele. Porque agora, pensando melhor, raciocinando com clareza, ela não teria coragem de prosseguir com aquilo. Depois ficaria mais difícil. Ela ficaria completamente apaixonada e perdida e sofreria muito mais para dizer adeus. E ela estava cansada de sofrer.
- Isa, posso entrar? – Vicky indagou, constrangida por ter que bater novamente à porta.
- Claro, Vicky. Entra, eu já estou quase pronta.
- Ah, Isa... Eu não queria ter que vir aqui te incomodar de novo, mas John está ficando tão impaciente!
Isa riu e comentou:
- Quem herda não rouba.
- Hum?
- Erik era igualzinho, Vicky. – sorriu ao lembrar dele. Agora conseguia pensar nele e não sofrer. Conseguia falar nele e sorrir. Sentia saudades, mas já não doía tanto. – Agora só falta John querer nos esperar no carro. – gracejou, pois era algo que Erik costumava fazer.
- Mas ele já esta no carro, Isa.
- Sério?
- Hunrum.
Olharam-se com cumplicidade e gargalharam.
- Ah, esses homens! – Isa zombou.
- Falando em homem Isa, e o meu irmão?
- Teu irmão? O que tem ele?
- Estava pensando em convidá-lo também para comer a pizza, pois seria uma ótima oportunidade para apresentá-lo a John.
- Não, Vicky. Não faça isso! – Isa se alterou um pouco, deixando Vicky desconfiada.
- Por quê? Vocês brigaram?
- De certa forma, sim. – suspirou, lembrando-se da reação exagerada de Adam.
- Ah, já entendi tudo! Esse meu irmão é às vezes tão difícil, Isa! Sei bem pelos mil anos de convívio com ele o quanto ele pode ser cabeça dura! No mínimo ele ficou zangado por você querer escondê-lo de John e ficou irritado. Mas ele é assim mesmo, Isa. Ele estoura e grita, descarrega tudo, mas logo depois se arrepende e vem atrás da gente para fazer as pazes. Perdi as contas de quantas vezes ele já me fez chorar por causa de seu comportamento explosivo! Mas se você gosta mesmo dele Isa, vai ter que aprender a conviver com isso. É difícil, mas você logo aprenderá a lidar com ele. Mas quando ele vem atrás da gente ele é tão querido, tem que ver! Ele, quando arrependido, fica um amor. – ela sorriu.
- Pode ser, Vicky. Mas eu não pretendo mais ficar com ele.
- Por que, Isa? Eu consigo ver em seus olhos que você gosta dele e eu acho que vocês combinam tanto!
- Para que, Vicky? Para que ficar com ele se eu terei que ir embora depois? Eu não posso ficar aqui, Vicky. Já te expliquei os motivos. Então de que adiantaria ficar com ele? Para depois sofrer?
- Mas não tem jeito mesmo? Você não tem como convencê-las a vir morar aqui também?
- Você sabe que não... Se fosse só a minha mãe talvez ela aceitasse... Eu quando vim para cá pretendia ficar mais tempo, mas com tudo isso está acontecendo lá em casa, terei que voltar antes do planejado. – fez uma pausa, respirando fundo - E agora que Ilana vem ficar com Dilan um tempo, eu tenho que voltar para ficar com elas. Não posso ser egoísta, Vicky. Elas cuidaram de mim quando eu fiquei mal, agora é a minha vez de retribuir. E tem também a promessa que eu fiz ao meu pai...
- Eu sei, Isa. Mas não queria que você fosse embora. Vou sentir tanto a tua falta! – se agarrou na amiga, com tristeza. – Mas Adam podia ir para lá, não é mesmo?
- E deixar os negócios da tua família sozinhos, que ele reergueu com tanto sacrifício? Não, Vicky. Nem eu gostaria que ele fizesse isso e nem ele ficaria feliz. E ele não poderia abandonar vocês.
- É.... Você tem razão... – balbuciou, com uma tristeza evidente estampada no rosto. – Acho que não tem jeito mesmo...
- Mas deixa isso para lá, Vicky. Não fique triste não. Eu ainda estou aqui, não estou? Então vamos aproveitar! Sairemos agora, mais tarde comeremos a pizza que o John nos fará e amanhã arrumaremos o jardim. Não parece divertido?
- Sim! – ela logo abriu um largo sorriso, mais animada.
- John é um amor, não é? – Isa indagou pelo caminho.
- É sim! – Vicky respondeu, entusiasmada com o novo amigo.
*
- John, tua pizza está uma delícia! – Isa afirmou, de boca cheia.
- Claro, né! Depois que vocês beberam quase uma garrafa de vinho inteirinha, iriam gostar de qualquer porcaria que eu fizesse – ele debochou, fingindo-se ofendido.
- Mas você também bebeu! – Isa retrucou.
- É John, você bebeu bem mais do que a gente! – Vicky exclamou, apontando para a segunda garrafa de vinho vazia.
- É, mais eu tive que abrir essa outra garrafa e deixar bem longe de vocês duas para poder sobrar para mim! – falou se agarrando a segunda garrafa - E essa é minha. Ninguém mandou vocês beberem todo o outro vinho e não me darem nem um cálice. Nem um único cálice! – ele resmungou, mas logo deu uma gargalhada reparando nas expressões chateadas que as duas faziam.
- Mas você se trancou na cozinha e não deixou a gente entrar – Vicky comentou e debochou: – Não sei para que tanto mistério!
- Queria que fosse surpresa. – ele se justificou, rindo e com a boca cheia.
- Pois é, e como não tínhamos nada para fazer e já estamos impacientes, ficamos bebendo e conversando. Não é, Vicky?
- Que desculpa esfarrapada! – John ironizou. – Desculpa de bêbadas não vale!
O clima estava bem descontraído e todos estavam relaxados e rindo a toa pelo efeito do vinho. Apesar de concordarem que pizza combinava mais com cerveja, optaram por um vinho, que se encaixava melhor com as baixas temperaturas que fazia naquela noite.
Vicky levantou-se para tirar a mesa e Isa tentou fazer o mesmo.
- Não, Isa. Você fica ai. John tem um assunto para te falar. Não é John?
- É, sim.... – Pego de surpresa ele não soube o que responder. Mas sabia que Vicky estava certa, ele não poderia fugir do assunto por muito mais tempo.
Vicky foi até a cozinha e logo voltou para buscar o resto da louça.
- John! Que bagunça que você fez! Tem farinha por todo lado! – fingiu estar irritada, mas logo gargalhou ao reparar na expressão magoada com que ele a fitava – John! Eu estou brincando, viu? Terei o maior prazer em limpar aquela bagunça. A pizza estava tão deliciosa que compensa qualquer esforço. E nada de querer me ajudar não, dona Isabela. John precisa mesmo conversar contigo. Bom, vou deixá-los a sós. Boa conversa para vocês. – se despediu de cada um com um beijo no rosto, aproveitando para demorar um pouco mais no rosto de John.
- Acho que ela gosta de você. – Isa cochichou assim que Vicky fechou a porta da cozinha para deixá-los mais à vontade.
- Eu também gosto dela, Isa. Ela é diferente das outras. Mas a Vicky me faz tão bem que eu não quero me envolver e perder sua amizade. Ela me entende sem que eu precise de palavras. Não sei explicar... Mas prefiro não correr o risco de me envolver e perder isso.
- Mas você pode ter as duas coisas, John.
- Não, Isa. Comigo nunca funcionou assim. Nunca tive nada parecido ao que você teve com Erik. Nem de longe. E depois você me conhece... Não quero magoá-la.
- Mas você pode tentar. Se não tentar, nunca terá.
- Eu sei o que eu estou fazendo, Isa. Mas não é sobre isso que eu quero falar. Tenho algo para te mostrar.
- O quê? – arqueou as sobrancelhas, apreensiva – É sobre o Erik, não é?
Ele assentiu, balançando a cabeça em silêncio.
- Espere ai que eu vou buscar.
Isa concordou, não conseguindo disfarçar seu nervosismo.
“Algo sobre o Erik, o que seria? Algo sobre o meu amor!”- suspirou, agitada. Ter uma noticia sobre ele, talvez uma notícia nova, era como se pudesse ter mais um pouquinho de Erik. Como se ele voltasse um pouco para ela.
Ele voltou portando algo à mão. E embora não quisesse mostrar a Isa de imediato e tentasse esconder, ela logo percebeu que era uma fotografia.
- Que foto é essa, John? Eu quero ver! Eu preciso ver! – indagou, ansiosa, quase se atirando sobre ele para agarrar a fotografia.
- Isa. Deixe-me falar antes. Eu preciso falar antes. – colocou o retrato atrás de suas costas.
- Está bem, então fale logo que eu quero ver!
- Eu estava em duvidas se eu devia te mostrar essa foto ou não, mas a Vicky me aconselhou a fazê-lo... O Roberto me deu apenas no mês passado, quando eu voltei para casa.
- O que é John? É uma foto de Erik?
- Sim, Isa – ele baixou a cabeça, com tristeza, evitando fitá-la. - Uma foto que tiramos antes de irmos embora da festa. A última foto de Erik com vida, Isa. – A encarou, com os olhos úmidos. Estava quase chorando.
Isa nem precisou ver a foto. Antes mesmo de vê-la, sentiu a emoção aflorar, as lágrimas chegarem rapidamente ao seu rosto, lágrimas que ela havia tentado chorar naquele dia e que haviam sumido. Lágrimas que ela achava que haviam secado, mas que agora voltavam com uma espantosa velocidade, como que numa enxurrada.
- A última foto de Erik com vida – ela repetiu, atordoada. Estava paralisada, sem reação, sem perceber o que falava, apenas repetiu as palavras de John, como um robô. E voltando a si, arrancou a foto das mãos dele – Me dá! Me deixa ver!
- Uma foto de Erik! E ele está tão lindo – ela comentou, acariciando o retrato. Acariciando e alisando o rosto de Erik. E ficou alguns minutos parada, apenas observando e relembrando de suas feições. Levou a fotografia aos lábios e beijou a face eternizada de Erik. A última expressão de vida dele eternizada em um retrato. – Ele está com cara de bêbado John. Ele havia bebido, não havia, John?
John chegou ao lado dela e reparou em seu irmão.
- Cara de bêbado? Você acha, Isa? – ele também estava emocionado e a voz falhava.
- Sim. Será que ele sofreu, John? Será que ele teve dor? Porque o álcool pode ter funcionado como uma anestesia, não é? O álcool pode ter diminuído um pouco a dor, não é? – indagava ansiando pela reposta afirmativa.
- Creio que sim, Isa. Mas foi tudo tão rápido, que penso que ele não teve tempo de sentir nada.
- Tão rápido? Como você sabe? Você se lembrou, John? Você se lembrou de como foi o acidente?
- Lembrei, Isa. De algumas coisas... As lembranças vieram aos poucos... Tipo em flashs, sabe? – ele não se agüentou e começou então a chorar – Eu vi o Erik, Isa. Eu vi...
Os dois se abraçaram, tentando consolar um ao outro. Isa levou John até o sofá, tentando fazê-lo se abrir e falar.
- E você já falou isso para alguém, John?
- Só para Vicky, contei hoje. E ela disse para eu te contar. Você quer ouvir, Isa? Você quer saber como foi?
- Sim – ela balbuciou – Eu quero, Johnny, eu preciso saber...
- O Marcão estava dirigindo, eu estava no banco do carona e o Erik no banco de trás. Erik era o único sem cinto de segurança, Isa. O Marcão não bebeu nada, viu? Ele não teve culpa nenhuma. Passávamos num cruzamento e um carro se atravessou com o sinal vermelho, em alta velocidade, e nos acertou em cheio. E foi tudo tão rápido! Eu vi o carro vindo em nossa direção, vi que ele nos acertaria, vi que não dava tempo de sairmos do caminho, vi que era tarde para qualquer coisa.... E foi tão rápido, que nem deu tempo para pensarmos em nada... Fechei os olhos, o carro bateu no nosso, e o nosso girou tanto, que era como se estivéssemos voando. Eu me senti voando e depois ouvi um barulho, muito alto, do carro voltando ao chão. Mas foi tão rápido, que nem deu tempo de sentir nada. Quando vi o carro já estava parado. Quando percebi, tudo havia acabado. Meu nariz doía, minha perna doía, meu corpo estava preso, havia cacos de vidro sobre mim e espalhados por todos os lados em que eu olhava. Eu chamava por Erik, e ele não respondia. E não conseguia me virar para ver se ele ainda estava no banco de trás. Ouvi vozes na rua, percebi gritos desesperados e logo desconfiei que o Erik havia sido jogado para fora do carro. Em seguida tive certeza disso, pois percebi que as pessoas gritavam por causa dele. E num grande esforço, pois tudo doía e meu corpo estava preso, eu consegui me girar e olhar para fora. E por alguns segundos, pois eu não agüentava ficar naquela posição, eu vi o Erik. Eu vi o Erik caído e estendido no chão. Eu vi que ele havia sido jogado para longe. E eu logo percebi o quanto seus ferimentos eram sérios... Naquele momento eu parei de sentir dor por mim, e passei a temer pela vida do meu irmão. Vi ele por poucos segundos, Isa, mas agora que me lembrei, não consigo mais esquecer aquela imagem. E era para eu ir no banco de trás e não ele. E eu teria usado o cinto, sei que teria. Ou eu teria morrido no lugar dele.
- John! Você não deve pensar assim! A culpa não é de ninguém! Foi um acidente! Uma fatalidade... – fez uma pausa – Mas sabe que eu também me culpo? Também acho que ele morreu por minha causa.
- Por que, Isa? Você nem estava lá.
- Por isso mesmo, John. Eu devia estar lá. Devia ter ido com ele.
- Mas você estava doente, Isa. Ele que deveria ter ficado em casa cuidando de ti.
- Sabe que ele cogitou essa hipótese e eu tive que insistir muito para que ele fosse? Pensava que ele não poderia deixar de ir ao aniversário do Roberto... Que não seria justo ele não ir à festa de um dos seus melhores amigos por causa de uma simples gripe.... Mas se eu soubesse, teria pedido para ele não ir.... Teria pedido para ele ficar comigo. Teria sido extremamente egoísta e teria feito ele ficar comigo.
- A gente não pode prever essas coisas, Isa.
- Eu sei – ela murmurou.
Ficaram em silêncio, de cabeças baixas.
- Obrigada John, pela foto. Eu adorei – sorriu, comprimido-a contra seu peito. – Vou levá-la sempre comigo. Muito obrigada mesmo.
- Agradeça a Vicky e não a mim. Se dependesse só de mim, eu não sei se teria te dado.
- Vicky! – Isa gritou, chamando a amiga à sala.
- O quê foi? – ela entrou na sala assustada, pois conhecia o tema da conversa e sabia que eles deviam estar tristes. – Eu ainda estou terminado de limpar a bagunça de John. Vocês querem alguma coisa?
John ainda fitava o chão e evitava encará-la.
- Eu queria te agradecer, Vicky, por ter aconselhado o John a me dar essa fotografia. Não sabe como fico contente por tê-la.
- Que bom, Isa. Eu pensei que você gostaria mesmo de ficar com ela – ela deu um breve sorriso para a amiga, mas logo voltou os olhos para o John, fitando-o com preocupação. Isa percebeu seu interesse e resolveu deixá-los sozinhos.
- Chega de trabalhar, Vicky. – tirou o pano de prato das mãos dela – Deixa que eu assumo a partir de agora.
Isa foi para cozinha, deixando a Meggy com eles, que o tempo todo estava dormindo escolhidinha em um canto, embaixo das cobertas. Não havia mais quase nada para arrumar, mas ela também queria ficar sozinha. Precisava de um tempo para digerir tanta informação. Precisava de um tempo para namorar aquela nova imagem de Erik. Aquela que era a última imagem dele com vida.
- John, você está bem? – Vicky sentou-se ao lado dele e indagou, recebendo como resposta apenas o silêncio. – Não fica assim não.
Chegou um pouco mais perto dele. Ele continuava fitando o chão, com a cabeça baixa e o corpo inclinado para frente. Parecia muito triste e Vicky sentiu um desejo inexplicável de consolá-lo. Sem pensar muito no que fazia, o abraçou e o trouxe para perto dela. Ele permitiu o abraço, sentindo-se um pouco melhor com a proximidade. Ficar nos braços de Vicky lhe fazia bem, fazia com que se sentisse bem.
- John, não fica triste não... – ela pediu, afundando a mão direita em seus cabelos e fazendo carinho.
- Eu o vi caído, Vicky... – ele enfim a encarou com uma expressão melancólica – Eu vi e não posso me lembrar porque dói muito.
Ela assentiu, muda. Queria mostrar que o compreendia.
- Venha, John. – ela levantou num impulso e o puxou pela mão.
- Para onde? – ele indagou, confuso.
- Venha deitar comigo.
- Hum...?
- Só deitar, John. Deitar e dormir. Hoje você fica comigo para não ficar sozinho nesse sofá. Você está tão triste que eu não quero te deixar sozinho.
Ele deu um leve sorriso e concordou, se deixando levar. Subiram as escadas de mãos dadas e deitaram juntos na cama. Ela se aconchegou em suas costas e o abraçou por trás.
- Assim você se sentirá melhor, John. – apertou o abraço, cuidando para deixar seu corpo um pouco afastado do dele – Um abraço sempre faz bem.
- Mas assim eu não conseguirei dormir, Vicky. – ele sorriu e se virou de frente para ela, passando a encará-la.
- Hum? Por que não? – perguntou confusa, deixando transparecer seu nervosismo. Seu coração passou a bater agitadamente, pela maneira com que ele a olhava naquele momento. Estavam com os rostos bem próximos um do outro e Vicky desviou o olhar. Estava tensa e não sabia como proceder.
- Obrigado, Vicky. – ele comentou, fazendo um carinho em seu rosto. Ela fechou os olhos por alguns segundos – Obrigada por tudo que você fez por mim. Pelos conselhos, pela amizade, pela compreensão.
- E tudo em apenas um dia – ela enfim relaxou e sorriu, mesmo que timidamente. Mas não sabia mais o que dizer, e as únicas palavras que vieram em sua mente foram:
- Mas não precisa agradecer não, John... Foi um prazer...
- Foi é? – ele indagou, provocando-a, chegando com o rosto ainda mais próximo do rosto dela, quase colando os seus lábios nos dela.
- O que? – inquiriu, confusa. Estava desnorteada pela proximidade e não sabia bem o que dizia... Esquecera sobre o que falavam... Estava perdida. Só o que ela pensava naquele momento era em beijá-lo. Sua boca estava tão próxima a dela, mas ao mesmo tempo parecia tão distante.
Vicky reparou em John desde o começo e mesmo antes de conhecê-lo, já estava interessada nele. Mesmo tendo o visto apenas através de uma fotografia, seu coração já batia por ele, e esse sentimento só cresceu após conhecê-lo. E seu interesse fez com que ela procurasse qualquer sinal de interesse da parte dele. Que tivesse analisado seu comportamento durante o dia, tentando perceber qualquer palavra, qualquer olhar, que lhe desse esperança que ela poderia vir a ser mais do que uma amiga. Mas nada encontrou.
Ela percebeu que ele gostou dela também – isso sim - pois eles ficaram amigos rapidamente e logo se sentiram perfeitamente a vontade um com o outro. E ele lhe fez algumas confidências e pediu conselhos, fazendo inclusive revelações que ela sabia que ele não fizera a mais ninguém. Ela procurou escutá-lo atentamente e aconselhá-lo da forma que acreditava que seria a mais correta, como uma grande amiga faria. Amiga – ela afirmava a si mesma, tentando aceitar – que era só isso que ela seria dele. Mas agora estava confusa com o jeito que ele olhava para ela, com a forma que ele se aproximava dela. Talvez ela estivesse enganada e ele tivesse interessado nela também.
- Foi um prazer? – ele prosseguiu com a provocação.
Ela ficou ainda mais atordoada e se atrapalhou com as palavras, não dizendo nada que fizesse sentindo.
- Vicky, posso ser sincero contigo?
- Claro, John. Pode e deve ser.
- Eu estou morrendo de vontade de ficar com você. Estou louco para beijá-la agora mesmo... Mas....
- Mas? – ela perguntou, praticamente não respirando, olhando fixamente para ele, ansiando pela resposta.
- Mas não podemos ficar juntos. Você vê... A Isa ainda não está bem e não podemos ficar juntos e deixá-la de lado.
- Mas eu não quero deixá-la de lado.
- Eu sei, eu percebi que você gosta dela. Mas a gente só poderia ficar junto se não ficássemos na frente dela, entende? Porque só estamos nós três nessa casa e eu acredito que ela não se sentiria bem... Ela poderia ficar triste e eu não quero que isso aconteça.
- Eu também não quero que ela fique triste. Se é assim, a gente pode continuar sendo apenas amigos. – tentou não demonstrar o desgosto que sentia, pois achava que ele tinha razão.
- Mas eu posso te beijar agora e continuar a ser teu amigo amanhã?
- Hã? – a proposta a pegou de surpresa.
- Você deixa, Vicky? Eu te beijar agora? Você continuará a ser minha amiga amanhã?
Ela sorriu e respondeu:
- Só deixo se você prometer que se comportará.
- Como assim?
- Que será apenas um beijo, mas que depois você virará para o lado e dormirá aqui comigo, ficando bem quietinho e bem comportado.
- Mas só um beijo? Não podem ser vários beijos ao invés de um só? – fez uma carinha pidona que fez com que ela se derretesse - Eu prometo me comportar se você prometer que será mais de um beijo.
- Se o beijo for bom e me der vontade de repetir – ela o provocou e sorriu. Então John não perdeu mais tempo e a beijou.
***
- Erik, creio que estou pegando a gripe da tua mãe. Estou me sentindo tão mal...
Ele chegou perto da esposa e colocou a mão sobre sua testa, tentando sentir sua temperatura.
- Você está quentinha mesmo. Já tinha reparado que você estava meio abatida durante todo o dia. Você quer ir para casa, Isa? Pode deixar que eu cuido de tudo por aqui. Pode deixar que eu fecho a agência.
- Mas você não tinha que sair para comprar o presente do Roberto?
- Não, meu amor. Eu não preciso ir agora, posso ir mais tarde, ou mesmo amanhã. Vai para casa agora, toma um banho quente e um anti-térmico e vai deitar. Amanhã eu quero te ver perfeitamente recuperada, pois temos um aniversário para ir.
- Eu sei, meu amor. Mas deve ser uma gripezinha só de um dia, amanhã já estarei melhor.
- Assim espero. O que eu farei na festa sem ti? – chegou perto da esposa e a abraçou, depositado um beijo sobre seus lábios quentes. Ela se encolheu toda, sentindo calafrios pelo o corpo. Calafrios que indicavam o aumento de temperatura e confirmavam que a febre chegava com força total.
- Venha Isa, eu vou te levar para casa. Tremendo e batendo queixo desse jeito, você não tem condições de ir sozinha. – se dirigiu para sua funcionária - Dona Graça, se algum cliente chegar e quiser falar comigo, diga que eu logo estarei de volta.
- Está bem, Sr. Erik. Melhoras para você, dona Isabela.

Mas não era uma gripe de apenas um dia, pois no dia seguinte ela ainda amanheceu com febre.
- Penso que logo ficarei melhor, Erik. Acredito que se eu me cuidar, ficarei bem para ir à festa contigo. – forçou um sorriso para ele – Você não acha que eu estou melhor? Eu não pareço melhor?
- Não, meu amor. Você não me parece nada bem – sentou ao lado dela e tentou consolá-la. – O que foi, querida? Qual o motivo dessa carinha triste?
- Eu não queria te deixar sozinho... Queria ir contigo na festa... Sei que você não gosta muito de festa, e gosta muito menos de ir sozinho. – ela resmungou.
- Mas eu não vou, Isa. Tenho a desculpa perfeita para não ir. A minha esposinha está doente em casa e eu tenho que cuidar dela. – afirmou, decidido.
- Não, Erik. Você deve ir. O Roberto ficaria chateado... E depois, eu não vou fazer nada além de dormir, com esse monte de remédios que eu estou tomando, e quando eu acordar, você já estará de volta.
- Mas eu não quero ir sem você. O que eu irei fazer sem você?
- Você conversará com seus amigos, com seu irmão e nem sentirá a minha faltar.
- Hum... Vou pensar e de noite eu decido o que fazer.
- Está bem, amor. Agora eu vou dormir mais um pouquinho, está bem? Quero ver se ainda dá tempo de eu melhorar até de noite.
Ele achou graça das palavras dela, pois sabia que por mais que ela se esforçasse, não ficaria bem até a noite.
*
- Tchau amor, se cuida, está bem? – depositou um beijo sobre os lábios da esposa, que estava deitada e encolhida no sofá, sentindo muito frio e agarrada na cachorrinha Meggy.
- Tchau amor, se comporta, está bem?
- Você também. Vê se não faz nenhuma arte sem mim.
Ela riu e completou:
- Não demore muito, eu te amo.
Trocaram mais um beijo e então ele saiu, ressabiado por ter que deixá-la sozinha. Mas ela tanto insistira para que ele fosse, que ele acabou cedendo.
Despediram-se e se viram pela última vez, sem saber que seria a última vez. Trocaram o último beijo, sem saber que seria o último beijo. Erik fechou a porta e saiu, sem saber que desta vez seria para nunca mais voltar.
Assim que ele se foi, Isa relaxou e dormiu tranquilamente no sofá. Dormiu até ser despertada por um telefonema. Por um telefonema que mudaria sua vida para sempre e que ela jamais esqueceria...
*
Capítulo 14
*
Isa estava sozinha em casa, pois John e Vicky haviam saído para irem ao shopping. Ela não pôde ir com eles, mesmo estando com muita vontade, porque tinha que preparar as aulas que daria no dia seguinte. Dilan estava fazendo um intensivo, marcando várias aulas em seqüência, pois viajaria já na próxima semana para o Rio de Janeiro. Ele planejava surpreender Ilana com algumas frases em português, já que Isa não contara a ela nada a respeito das aulas. E o mesmo ocorria pela parte de Ilana – e Isa achava isso extremamente engraçado e bonitinho – que se matriculara em um curso de inglês desde que voltara da Inglaterra e também planejava surpreender Dilan.
E Isa estava concentrada em seus afazeres, vestida com uma calça de abrigo cinza surrada e um moletom velho e encardido e com os cabelos atados num desleixado rabo de cavalo, quando foi interrompida por um toque na campainha. Nunca imaginou quem poderia ser, se soubesse, teria ao menos se olhado no espelho antes. Mas se soubesse quem era, nunca abriria a porta vestida daquela maneira. E talvez nem abrisse a porta, por mais bem vestida que estivesse.
- Adam! – exclamou embaraçada. Ficou constrangida por alguns instantes. Estava mal vestida e morrendo de vergonha por isso. Desviou o olhar, fitando o chão, sem saber o que fazer e nem como agir.
- Não vai me convidar para entrar? Está frio aqui fora – ele a encarou, esperançoso. Percebeu que ela estava receosa e talvez devesse ter ligado antes. Mas não sabia se ela aceitaria lhe ver, então resolveu arriscar uma visita sem aviso. Falara com Vicky antes e sabia que Isabela estava sozinha e que teria a oportunidade perfeita para se desculpar com ela. Mas ficou espantando pela maneira como ela estava vestida. Ela com aqueles trajes, sem nenhuma produção, sem maquiagem, mais natural impossível, estava mais linda do que nunca!
- Não sei... O que você quer?
- Quero falar contigo. Desculpar-me pelo meu comportamento no nosso último encontro.
- Se desculpar? – indagou, curiosa, arqueando levemente as sobrancelhas e abrindo a boca. – Está bem, pode entrar. Até porque o frio está entrando e congelando a casa.
Ele entrou e sentou-se no sofá, cuidando para afastar os papeis que estavam espalhados por todos os cantos. Meggy, assim que lhe viu, saiu de debaixo das cobertas e correu para fazer festa para ele.
- Oi Meggy – ele comentou, acariciando a cachorrinha.
Isa estranhava o fato de sua cachorrinha gostar assim dele, já que costumava evitar estranhos. Ele a pegou no colo e ela logo se acomodou, como se ali fosse o lugar certo para ela ficar.
- Isy.... Eu queria me desculpar... Agi como um tolo... Nem sei como me explicar.... Mas aqueles sapatinhos me assustaram, sabe? Nunca pensei em ser pai e fiquei apavorado com tal possibilidade... – fez uma pausa e como ela não disse nada, prosseguiu - Foram um presente, é?
- Sim. Um presente de Sarah, da minha ex-sogra. Quando Erik morreu, nós estávamos tentando engravidar e ela ficou sabendo e os fez para a gente. E agora, resolveu me dar.... Para eu guardar de lembrança, ou para se um dia tiver filhos. Mas não quero ter filhos, Adam. – ela subiu os olhos e o encarou, se justificando. – Eu queria ter filhos com Erik, agora parece que não faz mais sentido.
- Ah.... – Ele gostaria de ter se expressado melhor... Pensara tanto naqueles sapatinhos que agora a idéia de terem um filho não lhe assustava mais. Viera para dizer que estava disposto a ter um filho com ela, se era isso que ela precisava para ser feliz.
- Mas Isy... – ele queria continuar, mas não achava as palavras. – Você não pensa em ter um novo relacionamento? E em ter filho com outro homem? – queria completar e perguntar: nem comigo? Mas não o fez.
- Não, Adam. Só se eu um dia me apaixonar perdidamente por alguém, mas penso que perdi a capacidade de amar... – mentiu, evitando encará-lo, pois estava apaixonada por ele. Ainda não o amava, mas sabia que seria questão de tempo e provavelmente, de pouco tempo. Por isso, queria dar um fim a tudo, antes que ficasse mais difícil.
- E a gente Isy? Você não pensa na gente? O que está acontecendo entre nós não significa nada para você?
- Não. – ela mentiu, desviando o olhar.
- Eu sei que não é verdade, sei que você está mentindo, pois consigo ver isso em seus olhos, Isabela. Porque você está tentando se enganar? Porque você está fazendo isso com a gente?
- Porque eu vou embora, Adam... Porque eu tenho que ir e minha passagem já está comprada e não pretendo mais voltar. Nunca mais. – até porque sabia que era uma viagem cara e ela não teria condições de repeti-la tão cedo.
- Tua passagem já está comprada? Para que dia? – ele indagou, ansioso, percebendo-se um enorme angustia em seu tom de voz.
- Para o dia 27 de dezembro. Pretendo passar o ano novo com a minha mãe e com a minha avó. Só não parto antes porque estou esperando por Ilana, que vem para passar o natal aqui com Dilan e me pediu para esperá-la. Agora é a vez de Ilana ficar aqui e a minha vez de ficar em casa.
- E por que ela pode ficar e você não? Por que você tem que voltar, Isabela? – perguntou, com desespero. Fez uma pausa e prosseguiu. Resolveu desabafar o que lhe afligia, pois não estava conseguindo raciocinar direito. Tinha que falar a ela o que sentia, não suportava mais guardar – Eu nunca senti o que estou sentindo, Isabela, nem nada parecido. Não posso deixá-la partir... Não há nada que eu possa fazer para que você fique? Se você quer um filho, Isabela, eu posso ter um filho com você. Diga-me o que você quer, por que farei tudo o que estiver em meu alcance. Mas por favor, não vá embora.... Não me deixe, Isabela... – ele suplicou, quase num murmúrio.
- Adam... Viu como já está difícil? Viu como eu tenho razão em querer parar com tudo agora? A gente nem se envolveu ainda e já estamos tristes, já pensou como será depois?
- Mas a gente ainda tem três meses.... Podemos aproveitar esse tempo que nos resta juntos, não podemos?
- O que são três meses perto de uma vida inteira de saudades? As lembranças vão ficar tão sufocantes que eu não suportarei, Adam. Não agüento mais sentir saudades e não agüentaria sentir como se outro pedaço fosse arrancado de mim! Eu estou a um passo de te amar, Adam. Sabia? E eu não quero te amar, porque depois vai ser tão difícil para mim e eu não agüento mais sofrer!
Ele já havia falado demais, mas era tarde demais para voltar. Só o que lhe restava era prosseguir na tentativa de ficar com ela. Precisava romper sua resistência. Precisava ficar com ela, mesmo que por pouco tempo.
- E eu? O que eu faço com o meu sentimento, Isabela? Você está a um passo de me amar? E o que eu faço, se eu já te amo? O que eu faço para não sentir tua falta? O que eu faço para parar de pensar em ti o dia inteiro? O que eu faço com o que eu já sinto? Eu posso te visitar de vez enquanto, você pode vir para cá, a gente pode se falar por telefone, por e-mail, como você quiser. Só não posso ficar longe de você!
- Adam... namoro a distancia não dá certo.
- Mas com a Ilana e o Dilan está dando. – ele retrucou – Por que não pode dar certo para a gente também?
- Por que a Ilana vem para ficar com ele, talvez ela nem volte mais para o Brasil....
Ele a interrompeu.
- Então a tua irmã pode ficar aqui e você não, Isa? Por quê? – indagou, exaltado, assustando a Meggy, que levantou as orelhas e abriu bem os olhos.
- Porque eu tenho que ficar com a minha mãe, Adam.... Quando meu pai estava morrendo, em seu leito de morte, ele pediu para eu cuidar dela e nunca deixá-la sozinha.... Ele pediu para mim e não para Ilana! Ele confiava em mim e eu não posso negar o seu último pedido, não posso trair a confiança que meu pai depositou em mim.
- Hum... – ele ficou calado e reflexivo, não sabia o que dizer. – E ela não pode vir para cá? Ela não pode vir morar aqui com as duas filhas?
- Não com a minha avó doente, Adam.... Minha avó caiu no chuveiro e quebrou o osso da bacia e agora está morando na nossa casa, pois não tem mais condição de viver sozinha... E eu tenho que voltar para ficar com elas, Adam... Minha avó e eu sempre fomos muito ligadas, sabe? E eu tenho que voltar para ficar com ela. Ela precisa de cuidados, pois está ficando com Alzheimer e a doença está progredindo tão rápido agora, que eu tenho que aproveitar o tempo que ainda me resta com ela. Entende agora? E a gente tem tanta coisa em comum... Ela me ajudou tanto quando o Erik morreu... Ela também ficou viúva cedo, com 22 anos, e nunca mais se casou. Meu avô era quase 20 anos mais velho do que ela e ele morreu de um infarto fulminante, de uma hora para outra também, com pouco mais de quarenta anos. E ela amava muito o marido e como sentiu a mesma perda do que eu, seus conselhos, seus cuidados, foram muito importantes para mim. Entende?
- Entendo, Isy... Mas você pode voltar depois, ou eu posso ir para lá, como Dilan e Ilana....
- Eu não vou voltar, Adam! Eu não tenho trabalho e a viagem é cara, como eu conseguirei pagar?
- Eu te pago, Isabela. Te pago uma vez por mês, se você puder vir uma vez por mês. Te pago toda a semana, se você quiser!
- E você acha que eu vou aceitar?
Ele baixou a cabeça e murmurou:
- Eu sei que não, Isy... Eu já percebi o quanto você é orgulhosa... Mas eu gostaria que você aceitasse.
- Adam! Pare com isso! Eu já disse que não! E nada do que você disser me fará mudar de idéia, entendeu?
- Sim, Isabela. Eu entendo e se você acredita que isso seja mesmo o melhor a ser feito, irei te respeitar. Só te faço um único pedido, que eu espero que não seja difícil para você cumprir.
- O que Adam? O que você quer? – balbuciou, apreensiva com o que ele lhe pediria.
- Não fique mais com o meu primo, está bem? – ele a encarou com um olhar suplicante e infeliz.
- Eu não sinto nada por teu primo, Adam.
- Eu sei e é por isso que eu tenho medo.
- Hã?
- Por que o fato de você não sentir nada por ele faz com que você não tenha nenhum receio em se envolver com ele.
- É verdade – ela deu um leve sorriso com o raciocínio dele. – Mas eu te prometo, Adam, que não terei mais nada com ele.
- Está bem, então agora não me resta nada a fazer a não ser ir embora. Esta foi a tua última chance, Isabela, de ser feliz comigo. Não mais a procurarei, não mais a perturbarei. Já te disse tudo o que havia para ser dito e não mais repetirei os meus sentimentos. Já me rebaixei demais e já me arrependo de tê-lo feito. Eu não costumo agir assim, isso não faz parte do meu comportamento. Não espere que eu a procure novamente, porque eu não o farei. Já fui além do que deveria ter ido.
- Está bem. – ela se despediu de cabeça baixa, evitando encará-lo. E ele parecia tão triste, tão abatido, que partiu o coração de Isa. Tudo o que ela queria era abraçá-lo, beijá-lo e consolá-lo, até para poder consolar a si mesma. Mas foi forte e não o fez, pois tinha que ser assim.
*
- Isa, você gostaria de sair comigo hoje?
- Como assim, Gerard? Aonde você quer ir?
- Estava pensando em levá-la para dançar. Descobri um bar com musicas latinas, o La Bodega, e gostaria de levá-la lá.
Ela sorriu, considerando a proposta tentadora. Mas lembrou da promessa que fez a Adam e logo arranjou uma desculpa.
- Eu adoro dançar, Gerard, e faz tanto tempo que eu não danço... Eu adoraria ir, mas eu estou tão cansada hoje... Meu corpo dói em quase todos os lugares.... Podemos deixar para outro dia?
- Tudo bem, Isa... Mas achei que você gostaria de conhecer esse local... Lembrei de você quando eu estive lá. – ele suspirou, contrariado. – Avise-me quando você estiver mais disposta, pois meu convite ainda estará em pé.
- Está bem, Gerard. – forçou um sorriso e baixou os olhos. Gostaria de sair com ele, gostaria de dançar e se divertir. Mas temia que não resistisse a seus encantos, por mais que quisesse ser só sua amiga. Andava triste e cabisbaixa, sentindo muito a falta de Adam. E o pior de tudo: estava carente.
- E John, já foi embora?
- Sim, foi ontem. Ele planejava ficar só uma semana conosco, mas acabou prolongando sua estadia em mais uma semana. Mas agora teve que ir por que percebemos que os pais de Vicky estavam começando a se incomodar com a presença dele.
- Sim, eles se preocupam muito com a filha.
- Sim, já percebi – deu um sorriso com o canto dos lábios. Só que dessa vez ela não tirava a razão dos pais dela: Vicky e John estavam tendo um caso, o que foi facilitado por estarem sob o mesmo teto. Eles tentavam disfarçar esse relacionamento e Vicky tentava esconder de Isa que estava apaixonada, mas era algo tão gritante que não tinha como ser disfarçado. Embora não ficassem juntos na frente dela, Isa sabia o que acontecia desde o primeiro dia, desde que eles subiram para o quarto no dia que John lhe mostrou a fotografia. E Isa não quis confrontá-los para que lhe dissessem a verdade, preferiu que tudo ficasse assim. Preferia mesmo que eles não ficassem juntos na sua frente. Sabia que era um pensamento egoísta, mas perceber a felicidade alheia ainda lhe incomodava... Sentia falta de Erik e de seu relacionamento com ele e casais felizes faziam com que ficasse deprimida. Um pensamento feio e invejoso, ela sabia, mas não conseguia mudar como se sentia.
- E Dilan? Alguma notícia dele?
- Sim, falei com Ilana ontem. Eles estão bem.
- Quem é Daniel, Isa?
- Hum?
- Ouvi Dilan falando sobre um tal de Daniel.... É o ex namorado de Ilana, não é?
- Sim, é sim. Mas posso te contar, não é segredo nenhum. Todo mundo já sabe, eu acho.
- Eu não. Ninguém me conta nada – fez beicinho. – Sou um pobre coitado rejeitado – gracejou.
Ela riu.
- Eles moraram juntos por três anos, e então ele trocou Ilana pela secretária, dez anos mais nova do que eles. Depois disso, Ilana voltou para casa, para morar com a gente.
- Pela secretária? Mas o que ele fazia? Era médico?
- Não, era dentista. Ele e Claudia foram colegas de faculdade. Não te falei que a nossa amiga Claudia, a que mora aqui com o marido, é dentista? Foi ela que apresentou Ilana ao Daniel.
- Não. Achei que ela trabalhasse numa cafeteria.
- Sim, ela trabalha, pois não conseguiu validar o diploma aqui. Para isso, precisa fazer uma prova que além de ser muito cara é quase impossível de passar.
- Hum.... Então ela desistiu? E vai trabalhar para sempre servindo café?
- Não, ela não desistiu. Está estudando muito e no ano que vem pretende tentar novamente. Ela e Ilana foram colegas de turma no colégio e nós andávamos sempre juntas, sempre nós quatro.
- Quatro?
- Sim, Ilana e sua melhor amiga e eu e a minha melhor amiga: a Raquel. Aliás, falando nela, estou com saudades da Raquel. Faz tempo que eu não falo com ela. Se der, ligarei para ela hoje à noite.
Ele sorriu.
- Agora vamos trabalhar, Isa. Temos muito que fazer.
- Ok. – ela concordou, sorrindo.

- Raquel? Oi! É a Isa!
- Isa? Que saudades! Nossa! Que coincidência! Eu ia mesmo ligar para você hoje, sabia? Tenho novidades!
- Novidades? Coisa boa ou coisa ruim?
- Uma boa e outra ruim. Qual você quer saber primeiro?
- Ah, pode ser a ruim.
- A ruim? Eu e o Gustavo nos separamos e eu agora estou morando sozinha. Mas sabe que nem é tão ruim assim? Pois eu estou me sentindo tão bem! Sabe, já não estava dando mais certo e a gente brigava tanto, mas tanto, que não dava mais para continuar... E agora que eu estou sozinha, estou sentindo uma paz tão grande por não brigar mais, que quase não estou sentindo a falta dele. E além disso, eu estou me sentindo tão livre! Parece que após cinco anos, eu enfim estou respirando. Como se eu estivesse presa, sufocada, esse tempo todo, sabe? Se eu soubesse que seria assim, teria me separado antes.
- É que o Gustavo era muito ciumento e controlador, Raquel. Você mudou muito por causa dele.
- Sim, eu sei. Por isso me sinto assim, entende? Penso que agora poderei ser eu mesma novamente. Agora poderei fazer as coisas que eu gosto, usar as roupas que eu gosto, falar com quem eu quiser, sem temer pela reação dele. Posso beber demais, posso dançar a noite inteira, posso fazer o que eu quiser.
- Eu entendo amiga... E a noticia boa, qual é?
- Antes você deve saber que eu e a Karine nos reaproximamos. Como estamos as duas solteiras, estamos saindo juntas novamente. Sei que talvez você ainda esteja chateada com ela... Mas ela me explicou porque se afastou da gente, Isa. Ela me disse que não sabia como conversar com você, que não sabia como lidar com a morte do Erik e acabou se afastando. Mas ela quer se encontrar com você e se explicar pessoalmente. Ela me disse que está arrependida, Isa.
- Hum.... Não me enrola, Raquel! Qual é a notícia boa? – gracejou.
- Nós vamos visitá-la semana que vem, Isa! Não é maravilhoso? Estou morrendo de saudades! Eu e a Karine compramos as passagens assim, num impulso, sabe? Pura loucura! Mas eu estou mesmo louca e precisando viajar para mudar de ares. E eu falei com a Claudinha e ela me disse que tem muito homem gato aí e inclusive que o dono do Pub que você trabalha é lindão! Conta, Isa? É mesmo verdade? E você o beijou, foi?
- Nossa, como a Claudia é fofoqueira! – zombou.- Sim, eu o beijei e mais de uma vez. Mas agora não temos mais nada, somos só amigos.
- Mas por quê?
- Ah... Faltou química... Sabe quando você espera muito um beijo e quando ele acontece não é nada daquilo que você esperava? Parece que a gente não encaixou...,que ele não serve para mim. – ela riu - Mas quem sabe ele não seja perfeito para ti?
- Para mim?
- Claro, amiga. Eu terei o maior prazer em apresentá-los. Penso que vocês formariam um belo casal.
- Bom, se ele for tão lindo como a Claudia me falou, eu não rejeitarei a oferta. – ela riu - Não precisa nem dizer duas vezes!
- Que bom amiga! E que dia vocês chegam?
- Quinta-feira. Mas te ligo mais perto do dia para a gente combinar tudo.
- Claro! Nossa, fiquei tão feliz com essa notícia! Tchau amiga, se cuida. Beijos.
- Se cuida também e fica com Deus. Beijos.
Logo que Isa desligou o telefone teve um daqueles pressentimentos que às vezes costumava ter... Algo lhe dizia, não entendia bem porque, que ela não gostaria tanto assim da visita de suas amigas...

- O que foi Isa? Estou te achando um pouco tensa.
- Não sei, Mel. Estou sentindo uma coisa ruim, uma ansiedade, que nem eu sei explicar direito....
- Hum... – encarou a amiga com atenção - E as tuas amigas, quando chegam?
- Ah... Elas já chegaram aqui na Inglaterra há alguns dias, só que ainda estão em Londres. Mas hoje à tarde elas vêm. E de noite irão ao Pub ficar comigo enquanto eu trabalho. A Raquel está curiosa para conhecer o Gerard. Também, depois de tanta propaganda feita pela Claudia. – ela riu.
- E você não se importa?
- Com o quê, Mel?
- Que ela se interesse pelo Gerard?
- Claro que não, Melanie. Que idéia! Eu não quero nada com ele, por que me importaria?
- Não sei... Só estava pensando que poderia ser isso que estaria te chateando... – pensou um pouco e indagou – E elas sabem sobre você e o Adam?
- Sobre mim e o Adam? Claro que não! Por que saberiam se não há nada para saber? Nós não estamos juntos, nunca mais nos falamos e nem nos vimos.
- E se alguma delas se interessar por ele?
- É um risco que eu irei correr... Mas como elas se interessariam por ele se ele não freqüenta mais o Pub? Por que elas o veriam se nem eu o vejo mais?
- Isa! Eu esqueci de te contar! Hoje é o aniversário de George e eles comemorarão sexta-feira no Pub! Como eu sou desligada, amiga – exclamou, num sobressalto.
- Hum? – Isa arregalou as sobrancelhas e levou à mão ao peito, aflita por ter que finalmente reencontrá-lo.
Melanie a encarou, apreensiva.
- Eu o verei novamente... – ela balbuciou. – Mas Mel... Só você sabe sobre a gente, viu? Não conte nada a ninguém, muito menos à Karine e à Raquel. Sabe que no colégio a Karine era apaixonada pelo Erik e eles meio que tinham um caso? Mas ela não sabia dos meus sentimentos, aliás, ninguém sabia. E ela nunca me perdoou completamente por eu ter ficado com ele. Nossa amizade nunca mais foi a mesma. Mas ela nem sonhava que eu era apaixonada por ele desde os treze anos e o quanto eu sofria por vê-los juntos... Isso é o preço que a gente paga por ser discreta. Mas imagina se eu deixasse de ficar com ele? Imagina se eu deixasse de ficar com o amor da minha vida por causa dela? E eu gostava dele antes dela, ela é que não sabia.
- É. Eu entendo.
- E eu tenho medo de contar sobre o Adam e isso fazer com que ela se interesse por ele, sabe? Mesmo que não seja de propósito, mas pode se interessar até inconscientemente por ele, só para competir comigo e provar que dessa vez ela pode ganhar.
- Hum... Eu não a conheço e não posso te aconselhar. Você que sabe, Isa.
- É, eu que sei e prefiro manter segredo. Aliás, nem há quase nada para contar, já que passamos muito pouco tempo junto.

- Isa! Realmente, eu achei o Gerard lindo. – Raquel comentou com a amiga ao chegarem em casa. – Pena que ele nem reparou em mim.
- Eu não. Só achei bonitos os sapatos dele – Karine debochou.
- Sim, Isa. A Karine está com uns gostos bem estranhos agora, tem que ver os tipos que ela acha bonito! Um mais esquisito do que o outro! – Raquel retrucou.
- Melhor para mim, assim diminui a concorrência. Vocês pensam que eu sou burra? – Karine respondeu, fazendo uma careta para as amigas, mas logo caindo na gargalhada.
- Bom, sexta-feira vocês poderão conhecer meus outros amigos. Mas não esqueçam que o Dilan é da Ilana, meninas! – Isa afirmou e sorriu para elas.
- Ah... Que pena que Ilana não está aqui com a gente... Hoje estava tão divertido, com nós três e a Claudia, parecíamos de volta aos tempos de escola. Só faltou a Ilana. – Raquel resmungou.
- Sim, eu também me diverti muito, meninas. – Isa comentou. A visita das amigas estava sendo bem agradável e divertida.
- Sim, onde já se viu? Precisamos vir até a Inglaterra para nos encontrar! – Karine zombou.
- Meninas, falem baixo que amanhã a Vicky tem aula cedo. Não quero acordá-la.
- E esse aqui nesse retrato, Isa? Quem é? – Raquel indagou interessada, olhando uma fotografia da família Simons.
- É o Adam, o irmão dela. – respondeu, tentando não deixá-las perceber seus sentimentos.
- Hum... Que gatinho, Isa. Ele estará também no Pub sexta?
- Me deixa ver, Raquel. – Karine ficou curiosa e se aproximou para olhar – Ah... Não achei nada de mais.... Não posso dizer que ele seja feio, mas é sem graça... Homem para mim tem que ter aquele algo mais sabe? Esses bonitinhos sem graça não me atraem. E eu gosto de moreno de olhos castanhos.
Isa disfarçou um sorriso e sua satisfação, pois pelo menos a Karine não se interessaria por ele. Sentia-se aliviada.
- Sim, Raquel. Creio que ele vai estar. Mas não sei muito sobre isso, pois não somos amigos.
- Ah... Que pena... – Raquel largou a fotografia, logo desviando o seu interesse – Mas me fala do Gerard? Achei ele tudo de bom! Pena que ele nem reparou em mim....
- Ele é lindo mesmo! – Isa admitiu - Mas perigoso porque é um galinha.
- Ah, mas eu não pretendo casar com ele, Isa! – Raquel gracejou – Só dar uns amassos e uns pegas atrás daquele balcão já me deixaria satisfeita!
- Até parece, Isa! – Karine comentou – Isso aí é puro papo! Toda vez que a gente sai é a mesma coisa: ela fala, fala, mas na hora do vamos ver ela escapa e foge. Sabia que ela ainda não ficou com ninguém depois do Gustavo?
- Ah... Mas agora é diferente! Esse sotaque inglês é tudo de bom! Agora eu não iria resistir e nem fugir... Se até a Isa não resistiu ao Gerard, quem sou eu para fazer isso?
- Por que até a Isa? – Isa retrucou.
- Ah, Isa.... – Raquel ficou sem graça. – Você sabe por que eu disse isso, não sabe? Desculpa, mas foi sem querer... Falei sem pensar.
- Tudo bem, Raquel. Sem problemas...
- Amanhã nós iremos conhecer uma casa noturna que a Claudia nos indicou, Isa – Karine se intrometeu, quebrando o clima estranho. – Você não quer ir conosco?
- Ah... Amanhã eu não posso.... Darei aula sexta-feira cedo para Melanie e depois vem uma amiga de Vicky que também é minha aluna.
- Nossa, Isa! Como você está importante! Quantos alunos você já tem? – Karine indagou, satisfeita pela amiga.
- Quatro! – ela respondeu rindo – Dilan, Melanie e mais duas amigas da Vicky que querem conhecer o Brasil: a Gláucia e a Roberta. E sabe que estou adorando ensinar? Estou até pensando em dar aulas de inglês quando eu voltar ao Brasil. Eu posso fazer disso a minha nova profissão, não posso?
- Claro, Isa! – Raquel se aproximou, abraçando a amiga. – Você não sabe o quanto eu fico feliz por saber disso, Isa... Que bom que as coisas estão começando a dar certo para ti!
- É. Vir para cá foi a melhor coisa que eu poderia ter feito. Agora consigo ver as coisas melhor. Agora tudo começa a fazer sentido novamente.
- Que bom! – Karine também se juntou as duas num abraço triplo.

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